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JOSÉ ROBERTO TORERO
A feia e feérica feira
Vende-se no mercado da bola
todo tipo de jogador, não importa idade ou posição, e ninguém faz nada para coibir
HAVIA barracas dos dois lados,
e os feirantes gritavam para
chamar os fregueses. Todos
usavam ternos. Nas barracas, em
meio a amarelas mangas, verdes alfaces, pimentões vermelhos e berinjelas roxas, de vez quando se percebia cabeças de homens.
As cabeças sorriam e piscavam para os passantes, que falavam em línguas estranhas. Havia coreanos baixinhos, gordos franceses, bigodudos
portugueses, sorridentes alemães,
compenetrados ucranianos, espanhóis expansivos, árabes nababescos, exibidos americanos, irrequietos japoneses, russos silenciosos e
curiosos turcos.
Eles passavam pelas barracas
apertando frutas e cabeças, e os feirantes gritavam assim.
"Olha o abacaxi! Quem vai querer?
Freguesa bonita não paga, mas também não leva. Vai um volante hoje?
Compre um e leve dois. Prefere um
zagueiro? Do branco ou do negro?"
"Hoje tem abacate, tem rabanete e
tem atacante. Atacante novinho, novinho! Sem barba, direto dos juvenis!"
"Goiaba gostosa de Goiás! Quem
comprar uma dúzia leva um goleiro.
Goleiro do bom, que agüenta frio e
tem passaporte europeu. Quem vai
querer?"
Só depois de algum tempo percebi
onde estava. Aquilo era uma metáfora do tal mercado de jogadores. Passeando entre as barracas, comecei a
pensar que aquele mercado devia
ser diferente em outros tempos. Só
deviam ser negociados grandes jogadores. Mas atualmente vende-se
de tudo. Doni, pai de tantas decepções, encontrou lugar na Itália. Até o
Geílson, que tantos infartos causou
nos torcedores santistas, foi vendido. Até o Geílson!
No ano passado, os estrangeiros
compraram coisas boas, como Robinho e Fred, mercadorias de primeira. Agora, com nossos estoques em
baixa, eles vasculham, remexem, fazem a xepa. Deram sorte. Encontram um promissor Rafael Sobis,
um Bolívar modesto, mas competente, e um esforçado Wendel.
Os compradores já não são o Real
Madrid ou o Bayern de Munique.
Qualquer Madureira do outro lado
do oceano pode nos levar um bom
jogador. Jônatas, por exemplo, deixou o grande Flamengo pelo reles
Espanyol. E o Gênova, da segunda
divisão italiana, está levando o lateral-direito Ângelo, do Paraná.
Também não há problema de idade. Marcelo, revelação do Fluminense, pode estar indo embora para
a Rússia com seus 18 anos. E Edílson, com o dobro da idade, trocou o
Vasco pelo Japão.
O pior é que não há time que consiga segurar seus jogadores. O Internacional, mesmo tendo um Mundial
à frente, despediu-se de quatro atletas. O poderoso Cruzeiro perdeu
Alecsandro para o Sporting. E até o
organizado São Paulo viu Lugano
partir para a Turquia e Amoroso largá-lo para ser reserva no Milan.
O Brasil perdeu o bonde da história do futebol. Em vez de termos o
melhor campeonato do mundo, vemos os craques brasileiros dando
entrevistas em outras línguas. O
pior é que não há nada sendo feito
para reverter esta situação. Não há
leis sendo pensadas, os clubes não
organizam movimento de reação, os
torcedores assistem a tudo impassivelmente. E assim continua a feira.
"Olha o jogador brasileiro! Quem
vai querer? Tenho de tudo quanto é
preço para tudo quanto é gosto!"
Tevez
Pode ser excesso de ceticismo,
mas não acho que a saída de Tevez
do Corinthians seja uma prova da
capacidade de indignação dos argentinos ou algo assim. Creio que
ele fugiu, como Robinho, para forçar sua venda para a Europa.
Tevez posa de vítima ou herói
conforme a versão, mas desconfio
que a questão é somente dinheiro
mesmo.
torero@uol.com.br
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