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JUDÔ
Breno Viola, que tem síndrome de Down, conquista ouro em evento inglês e espera que medalha o ajude a namorar mais
Brasileiro brilha em torneio "para todos"
MÁRVIO DOS ANJOS
ENVIADO ESPECIAL AO RIO
Quando ganhou ouro no torneio Judo For All, disputado no
fim de semana passado em Clacton (Inglaterra), Breno Viola, 23,
esperou no pódio pelo Hino Nacional. Levou até um CD com a
música, mas a organização não tinha onde tocar. Nem precisou.
"Peguei a bandeira e cantei o hino sozinho", conta ele, sorriso no
rosto. O técnico, Leonardo Mataruna, que também treina a seleção
paraolímpica, acrescenta, emocionado: "Ele olhou para mim me
mandando cantar junto, e eu fui".
Tinha de ser completo. Portador de síndrome de Down, Breno
encontrou nas cercanias de Londres o único torneio internacional
aberto a atletas como ele.
O Judo For All, que só é reconhecido pela federação inglesa,
abriga todos os tipos de deficiências físicas e mentais, além de
crianças sem deficiência. Os organizadores reconhecem Breno como um dos seis faixas-pretas no
mundo com essa condição -e o
único nas Américas. Desses, apenas ele competiu em Clacton.
Na Paraolimpíada, por não haver categorias que separem os
atletas em condições de igualdade
de disputa, as raras modalidades
para deficientes mentais não contaram para o quadro de medalhas
de Atenas. Nos Global Games-03,
criados para suprir essa ausência
de disputa, o judô não figura.
"Desde 2002 fizemos uma pesquisa atrás de torneios em que ele
pudesse lutar", diz Ney Wilson
Pereira da Silva, presidente da federação do Rio e diretor técnico
da CBJ (Confederação Brasileira
de Judô). Professor de Breno desde os seis anos, ele comanda o
treino do pupilo no Flamengo,
quatro dias por semana.
"Meu treino é bastante puxado.
Além disso, faço musculação todos os dias, voltada para o judô",
diz Breno, que tem consciência de
sua condição e das necessidades
dos portadores da síndrome.
Mataruna conta que, após a entrega das medalhas, Breno fez
questão de chamar o segundo e o
terceiro colocados para o topo do
pódio. "Fiz isso para aumentar a
auto-estima deles", afirma o judoca, a quem a qualidade claramente não falta. Com 1,55 m e 59 kg, o
peso ligeiro diz que, mesmo baixinho, prefere mulheres grandes.
"Gosto de mulher tamanho GG,
meu negócio é fartura. Lá na Inglaterra eu beijei na boca sem falar inglês, só no "I love you". Pode
botar aí no jornal", diz ele.
Mataruna entrega o lado "garanhão" de Breno. "Ficou com uma
judoca escocesa chamada Suzie e
se apaixonou pela técnica do País
de Gales", declara o técnico.
Enquanto conversava com a Folha numa academia na Tijuca, onde malha, fazia o estilo galanteador. Com um olhar pidão, abraçava as mulheres que passavam e
chamava a assessora de imprensa
da federação do Rio de "anjo".
Também no judô Breno mostra
muita desenvoltura. Em treinos,
conta Wilson, não se furtava de
encarar medalhões do Brasil, como Flávio Canto, medalhista de
bronze nos Jogos de Atenas.
"Quero disputar a seletiva para
o Pan de 2007. Se perder, não tem
problema. E não tem que dar moleza para mim não", avisa Breno.
"O treinamento dele é igual ao
de um atleta de alto nível", diz o
técnico Mataruna, o que é confirmado por Ney Wilson. "Em 2002,
ele conseguiu a faixa preta como
qualquer um faria. Ele é a figura
mais marcante de superação para
os meus atletas."
Apoio precoce
A conquista de Breno começa
no apoio precoce da família. A irmã Kamille, 25, conta que a mãe,
Suely, teve até problemas no joelho de tanta dedicação às repetições de exercícios com o bebê.
"Ele começou a andar mais ou
menos na idade de qualquer
criança, quando o normal seria
demorar mais", diz ela.
Estimulado, Breno testou natação, jiu-jitsu e até vela, mas preferiu seguir no judô, no qual a família tem tradição de prática a partir
do pai, Roberto. O esforço familiar sedimentou o caminho para
Clacton, quando obteve do prefeito do Rio, Cesar Maia (PFL), um
patrocínio para ir à Inglaterra.
No dia 22, foi feito um treinamento de campo para separar os
atletas por capacidade motora.
No dia seguinte, Breno conquistou a medalha, com três vitórias.
Mas chegou a ficar ansioso antes dessas lutas? Breno conta: "Eu
fazia ioga antes. Repetia para mim
mesmo "eu vou ganhar, eu vou ganhar, porque se eu ganhar vão rolar muitas coisas'".
A reportagem pergunta o que
seriam. Breno responde sorrateiramente no ouvido: "Mulher".
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