São Paulo, segunda-feira, 01 de setembro de 2008

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comportamento

Memórias a mão

Distantes da superexposição em blogs, meninas mantêm o antigo hábito de escrever diários no papel

Patricia Stavis/Folha Imagem
Andrea, 19, resolveu escrever diários por não ter amigas para conversar

ALAN DE FARIA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Contar detalhes do cotidiano para qualquer pessoa, mesmo para aquelas que não conhecemos, tornou-se comum em blogs, flogs e comunidades virtuais como o Orkut e o Facebook. Mas nem todo mundo quer detalhar segredos íntimos na internet. Não à toa, muitas meninas ainda preferem revelá-los nos velhos diários de papel.
A estudante Andrea Riccio Nieto Lacerda, 19, começou a escrever em diários quando tinha apenas sete anos. À época, por ser uma criança introvertida, sentia-se muito sozinha na escola. "Acho que qualquer garota gosta de sair contando as novidades e os problemas por aí. Como eu não tinha uma amiga em quem confiasse de verdade, comecei a escrever."
Com o passar dos anos, ela deixou de escrever sobre sua rotina e passou a registrar pensamentos, idéias e momentos de angústia em sua agenda.
A relações públicas Débora Pinto Carneiro, 25, que escreve em diários há mais de dez anos, age da mesma forma. "O diário serve para eu desabafar coisas íntimas", confessa.
Já a estudante de jornalismo Ana Carolina Almeida Ferreira, 21, faz jus ao termo "diário" até hoje. "Escrevo todos os dias antes de dormir. Às vezes, quando estou muito cansada, atualizo no dia seguinte, mas todos os dias eu escrevo", diz.
O assunto? O que sente, pensa ou o que fez. "Conto a maior parte das coisas e escrevo como se ela, a minha agenda, soubesse tudo o que acontece comigo, como se ela conhecesse todo mundo. Chega a ser engraçado." Ela já tem nove diários.

Segredo absoluto?
Há três anos escrevendo com freqüência, a programadora de web Flávia Veiga Frota, 24, nunca deixou alguém ler seus textos. "O diário é algo muito pessoal", explica. Em contrapartida, a estudante Nathalia Lira, 16, confessa que concede acesso ao seu diário às pessoas nas quais confia. "A minha melhor amiga nem precisa ler o que eu escrevo, pois eu mesma conto", ressalva.
Carolina não costuma deixar suas amigas lerem o que escreve. No entanto, nas últimas férias, vivenciou algo inusitado. Como esqueceu sua agenda na faculdade, ela não a levou para Américo de Campos (interior de São Paulo, a 540 km da capital), cidade em que mora, e a deixou com uma amiga.
"Eu combinei com ela de mandar as atualizações por e-mail. Assim, eu digitava o que acontecia comigo, e ela escrevia na agenda. Foi a maior prova de amizade que eu já dei para alguém", conta.
Deixar de escrever no diário e passar a relatar o cotidiano na internet nunca passou pela cabeça de Débora. "Não escrevo para que as pessoas saibam o que fiz, mas, sim, para registrar os acontecimentos ou para refletir sobre meus sentimentos."
Segundo relatório do site Technorati, que monitora a blogosfera, havia mais de 70 milhões de blogs em março de 2007 (esse número pode ser superior a 100 milhões hoje) -a cada dia, há dois anos, eram criados 120 mil diários virtuais.
"Não vejo problema nenhum em blogs e flogs. Mas é importante saber que, expondo-se na internet, você sempre está sujeito a especulações e fofocas", acredita Andrea, que criou um blog quanto tinha 14 anos.
"Mas logo desisti dele: meus posts eram imensos, ninguém agüentava ler, e eu cansei de me expor tanto, embora não escrevesse absolutamente tudo o que escreveria em um diário ao qual apenas eu tivesse acesso."
Para evitar problemas, Nathalia não escreve nada muito relevante e revelador na internet. Há três anos, ela relata histórias em diários impressos.

De olho no passado
Mais do que desabafar e detalhar o cotidiano, Débora gosta de, ao reler os textos escritos em seus diários, saber que teve alguns momentos importantes de sua vida registrados.
"Podem, talvez, um dia servir para alguém, filhos, netos, sobrinhos, ou para eu mesma relembrar e aprender a lidar com algumas situações", diz.
Já para Flávia, os diários poderão fazer com que o seu filho saiba um pouco sobre sua vida -ela é mãe de um garoto de 8 meses de vida.
Ou, no caso de Carol, revelar o quanto ela amadureceu. "Vejo uma evolução. Na minha forma de escrever, na minha forma de pensar. Noto como eu cresci e percebo que minhas preocupações, meu jeito de escrever e até a letra mudam. É muito engraçado ler algum texto antigo e pensar: "Como fui idiota! Não acredito que consegui fazer isso um dia!'".


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