São Paulo, segunda-feira, 02 de fevereiro de 2009

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>>Álvaro Pereira Júnior

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A Ilustrada, ou por que a gente é assim

LEIO, VIDRADO, EM CÓPIA emprestada de um amigo, "Pós-Tudo - 50 Anos de Cultura na Ilustrada", o almanaque de aniversário do caderno cultural da Folha. Vou direto, é claro, às páginas que tratam dos anos 1980. Não há como descrever, a um leitor jovem, a importância da Ilustrada para minha geração. Lá escreviam Paulo Francis e Pepe Escobar. A Ilustrada era o canal.
Francis era a metralhadora furiosa que apresentou de tudo a um monte de moleques com alguma aspiração intelectual, mas que não vinham de nenhuma tradição artístico-literária. De Italo Calvino a Gay Talese, de Edmund Wilson a Norman Mailer, da "Esquire" à "New York Review of Books" e à "New Yorker".
E Pepe trouxe erudição e inquietude à crítica brasileira de música pop, cinema e literatura. Um viajante extremo, cosmopolita, amado e odiado em igual intensidade. Pepe é ouvido em "Pós-Tudo". Aliás, o único entrevistado ao qual se fazem perguntas mais duras, inclusive extrajornalísticas (como foi a briga com o Nasi? e aquele soco numa festa?).
"Pós-Tudo" é um panegírico. Não se pode esperar que aborde criticamente seu objeto. Ainda assim, a meu ver, exagera na leveza. Inicia perguntas com frases do tipo "você foi possivelmente o maior cronista de comportamento jovem dos anos 1980" (entrevista com Angeli) e "você, que foi também um excelente pauteiro da Ilustrada" (entrevista com Leão Serva).
A Ilustrada da minha época já como jornalista (nunca trabalhei no caderno, mas era colaborador e vizinho) praticamente inexiste em "Pós-Tudo". André Forastieri e Carlos Rennó são citados uma só vez, e nomes como Thales de Menezes e Marcos Smirkoff, nem isso.
Por fim, o livro aborda como processo contínuo algo que, a meu ver, representou na verdade uma forte ruptura. O relaxamento da atitude essencialmente crítica, representada por gente como Pepe e Forastieri, para, a partir dos anos 1990 de Érika Palomino, abraçar também um tipo de jornalismo amigo e "construtivo", participante de cena que cobre, ao menos na área pop.
Mas, enfim, cada geração com sua bronca. Essa é a minha.
P.S.: Vá correndo à página 176, onde Pepe Escobar escreve sobre o Clash.


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