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Cerveja é a droga preferida pelos jovens
SILVIA RUIZ
da Reportagem Local
Agosto de 96, sexta-feira à noite.
Marcelo (nome fictício), 18, sai da
aula e toma algumas garrafas de
cerveja no bar em frente à faculdade. Depois vai a uma festa. Bebe
mais. Ao voltar para casa, às 4h,
perde o controle do carro, choca-se contra um poste e morre.
O trágico fim de festa do estudante é uma das centenas de histórias dramáticas que envolvem o
abuso de álcool entre jovens. A
droga, que lidera a preferência dos
estudantes, é a que mais detona o
corpo e mais faz vítimas no país.
Pior: o consumo pesado, caminho
mais curto para a dependência,
vem aumentando nesse grupo.
O livre acesso à bebida, a cumplicidade dos pais e da sociedade e,
para completar, o incentivo intenso da propaganda (leia texto abaixo) fazem o quadro se agravar cada
vez mais, alertam os especialistas.
"Enquanto a sociedade, os pais e
o governo se preocupam com as
drogas ilícitas, há um "liberou geral' em relação ao álcool, que é
uma droga tão ou mais nociva do
que o crack e a cocaína", diz Dartiu
Xavier da Silveira, psiquiatra e diretor do Proad (Programa de
Atendimento a Dependentes, da
Unifesp - Universidade Federal de
São Paulo).
A maconha, considerada a droga
da juventude, perde de longe na
comparação com o álcool. Pesquisa realizada em 97 com estudantes
de dez capitais do país revelou que
15% deles consomem bebida alcoólica com frequência. A maconha é usada por 1,1% dos jovens,
segundo a análise, realizada pelo
Cebrid (Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas).
O que preocupa os especialistas é
que o consumo frequente e pesado
vem crescendo. Além disso, o consumo de álcool entra cedo na vida
desses estudantes: 50% dos alunos
entre 10 e 12 anos já fizeram uso da
droga.
"Quanto mais cedo o jovem começa a beber, mais dificuldade terá de abandonar o hábito. E mais: é
na adolescência que se estabelece o
uso frequente", diz Maria Lúcia
Souza Formigoni, coordenadora
da Unidade de Dependência de
Drogas da Unifesp.
²
A pior droga
Apesar de ter seu consumo liberado, o álcool é uma droga psicotrópica (atua sobre o cérebro e altera seu psiquismo) considerada
pesada pelos especialistas.
O abuso da bebida provoca 350
doenças físicas e psíquicas e é responsável por 90% das internações
por dependência de drogas nos
hospitais psiquiátricos.
"Os jovens têm dificuldade de
enxergar o problema da dependência do álcool porque, se comparada às outras drogas, ela leva
mais tempo, cerca de dez anos, para se instalar. O problema é que,
quando isso acontece, os danos são
maiores", diz Silveira. E, como o
jovem começa a beber, em média,
aos 10 anos, aos 20 pode ter se tornado alcoólatra, o que acontece
com 1 em cada 10 usuários.
Cerveja também é droga
Segundo a pesquisa do Cebrid, a
cerveja é a bebida mais consumida
(36,5%) pelos jovens. Em segundo
lugar está o vinho (15,3%).
O fato de a cerveja ter teor alcoólico mais baixo do que outras bebidas -cerca de 3,5%, contra 45%
do uísque, por exemplo- faz com
que muita gente acredite que pode
bebê-la à vontade, sem maiores
consequências.
O problema é que dificilmente as
pessoas ficam na dose tolerável,
que significaria tomar no máximo
três latinhas, esporadicamente.
"Recebo inúmeros pacientes jovens que bebem 20 latas em uma
noite, algumas vezes por semana",
diz Silveira. "Essa quantidade é extremamente tóxica."
Para o psiquiatra, é um erro acreditar que a cerveja é inofensiva.
"Ela é a porta de entrada para outras drogas, e não a maconha, como muitos imaginam."
O psiquiatra Evaldo Melo de Oliveira, diretor do Instituto Raid
(Instituto Recife de Atenção Integral às Dependências) confirma
essa tendência. "Quem trabalha
com dependentes sabe que todos
começaram com a cerveja." Levantamento do instituto mostra
que a cerveja é a bebida preferida
por 44% dos estudantes até 18
anos, e que 67,5% deles começaram a beber entre 12 e 14 anos.
"É bom lembrar que a cerveja,
como qualquer bebida alcoólica, é
uma droga ilícita para menores",
diz o médico. Mas comerciantes e
donos de bar ignoram descaradamente a legislação que proíbe a
venda de álcool para menores de
18 anos. Na pesquisa do Cebrid,
apenas 0,9% dos estudantes disseram que não conseguiram comprar o produto.
Aids e acidentes
Além do risco da dependência,
há outros muito mais imediatos
para quem abusa do álcool, como
o de se envolver em acidentes, em
brigas ou se contaminar com o vírus da Aids.
"Beber faz com que as pessoas
percam a capacidade de avaliar riscos", diz Silveira. Pesquisa realizada em 98 pelo Proad com 1.056 viciados revelam que quase 70% dos
usuários de álcool tinham comportamento de risco para a Aids,
ou seja, se "esqueciam" da camisinha depois de beber.
No caso dos acidentes de trânsito, os números impressionam:
análise do sangue de 1.114 vítimas,
realizada pelo Instituto Raid, revelou a presença de álcool em 61%
dos casos. Vestígios de maconha
foram encontrados em 7,3% das
vítimas, e de cocaína, em 2,3%.
A maior parte dos acidentes
(43,3%) ocorreu nos finais de semana. E no grupo das vítimas entre 13 e 17 anos, que nem poderiam
beber, 47,7% haviam consumido
álcool.
Se você costuma consumir bebida alcoólica, confira nas tabelas
nesta página os sinais de excesso e
evite que sua festa acabe mal.
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