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Álvaro Pereira Júnior
Rock e
olho roxo
Finalmente, a música entra no escândalo do
"mensalão".
Na CPI dos Correios,
na quinta-feira passada,
o deputado Roberto Jefferson disse
que estava com um medonho hematoma sob o olho esquerdo porque uma estante tinha lhe caído na
cabeça enquanto ele procurava um
CD de Lupicínio Rodrigues.
Ou seja, se a história é verdadeira,
vemos que, em meio à maior hecatombe política dos últimos anos, o
protagonista-mor da lambança se
entretém com os versos melancólicos do compositor gaúcho: "Há pessoas de nervos de aço/ Sem sangue
nas veias e sem coração...".
Sei que o salto de raciocínio pode
parecer meio brusco, mas, quando
eu soube da estante assassina e da
importância que a música assume
até numa hora dessas, me lembrei
do novo livro do crítico inglês Simon Reynolds, "Rip It Up and Start
Again", sobre pós-punk.
É que, no prefácio, o quarentão
Reynolds explica sua paixão pela
música, mais especificamente pelo
período de 1978-1984, quando ele
começou a acreditar que o rock era
algo que valia a pena ser estudado.
Não tenho um centésimo do talento, da erudição e da cultura musical de Reynolds, mas foi impossível
não me identificar com alguns trechos.
"Com certeza, a era pós-punk rivaliza com os anos 60 na enorme quantidade
de grande música produzida, na infusão de espírito de aventura e idealismo e na
maneira como a música parecia inextricavelmente conectada à turbulência social de uma época."
"Como crítico de rock, quando você chega a uma certa idade, começa e se perguntar se investir tanta energia emocional e mental nessa coisa chamada música
foi mesmo um ato de inteligência. Não é exatamente uma crise de confiança,
mas um vinco nas certezas. Isso me fez avaliar quando, exatamente, decidi embarcar nessa história de levar música a sério. O que me fez acreditar que a música
podia ser tão importante?"
Peço desculpas a Reynolds por citá-lo no mesmo espaço que Roberto Jefferson. Sei que seu texto fala de pós-punk e estou forçando um pouco ao estender
seus comentários à música como um todo. Mas não consegui fugir da analogia
ao constatar que, até no lamaçal do "mensalão", a música -ainda que seja Lupicínio, e não uma banda pós-punk- tem papel de destaque.
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