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Álvaro Pereira Júnior - cby2k@uol.com.br
CSS e Coldplay navegam no hype
NA SEMANA PASSADA, o Folhateen
deu reportagem de capa para a
banda paulistana Cansei de Ser
Sexy. Com ajuda do computador quântico inaugurado mês passado no Canadá,
calculei que essa foi a 106.575 vez que a
Folha publicou um texto festivo e favorável a esse grupo brasileiro que faz muito
sucesso no circuito indie europeu.
Ainda na semana passada, duas resenhas sobre os shows do Coldplay em São
Paulo chamaram a atenção. Uma de
Sylvia Colombo, na Ilustrada, outra de
Luís Antônio Giron, no site da revista
"Época". Ambas exemplares destoantes
do clima de quermesse e oba-oba que reina em nossa imprensa cultural. Eram críticas demolidoras, e muito bem fundamentadas, à banda de Chris Martin. "Sessão arrastada de lamúrias coletivas", disparou a Sylvia. "Estilo semigospel", avaliou Giron.
No início de seu texto, Giron reclamou
do entusiasmo com a que imprensa paulistana, especialmente a on-line, embarcou na onda dos fãs e se ajoelhou diante do
Coldplay. E alertou: "O entusiasmo da platéia não tem nada a ver com o que se passa
de fato no palco".
Essa observação nos leva de volta à cobertura laudatória que cerca cada passo do
Cansey de Ser Sexy. A banda é o máximo
porque o público vibra loucamente. A banda é o máximo porque a imprensa indie
britânica a eleva aos céus. Objeto e meio se
dissolvem num plasma indistinguível. A
música? Quem se lembra dela?
É delicado, neste momento, falar de
CSS. Não quero me juntar à legião de invejosos que não aceitam o sucesso da banda
e, mesquinhamente, ficam daqui do Brasil
torcendo contra. No ano passado, quando
as meninas saíram para a turnê americana, dei meus parabéns e escrevi que só isso
-tocar em clubes bacanas dos EUA- já
era mais do que qualquer banda independente brasileira tinha conseguido.
Mas a excursão americana era só o início. O CSS aconteceu mesmo na Europa.
Com os contatos certos e muita disposição, a banda caiu nas graças da máquina de
hype: o semanário "NME", a revista "Les
Inrocks" e mesmo a grande imprensa de
Londres simpatizaram com o CSS. Os reflexos não demoraram a chegar ao Bananão (obrigado, Ivan Lessa).
Tudo isso, é claro, acompanhado pela
Folha da maneira mais superlativa. A turnê americana pelos EUA foi tratada como
glória absoluta (escondida lá embaixo
num texto, a informação de que um show
chegou a ser cancelado por falta de público). A chegada à Europa foi descrita de modo não menos triunfal.
Curiosamente, na reportagem do Folhateen, vemos que a Warner quer relançar o primeiro disco do CSS, agora com um
esquema mega. Mas para que isso, se, como nos ensina a imprensa brasileira, o jogo já está ganho, EUA e Europa só falam no
CSS, só pensam no CSS?
Vou explicar: porque o sucesso do CSS,
embora real, inédito e legítimo, é menor do
que pode parecer, visto aqui do Brasil. O
CSS, por enquanto, bombou no circuito indie europeu, não muito mais do que isso.
Algumas críticas publicadas, especialmente nos EUA, foram bem negativas, destacando a falta de nuances do vocal da Lovefoxxx, a pouca coesão das composições, a
produção simplória, as letras infantis e o
fato de o som ser bastante derivativo de
Tom Tom Club e Le Tigre, para ficar só em
dois exemplos (e para usar uma palavra
branda, "derivativo").
É claro que tudo isso pode mudar: eles
podem arrebentar nos festivais europeus
de verão, podem ficar famosos no mercado
que interessa (os EUA), tocar no programa
do David Letterman, abrir a turnê de um
artista grande com simpatias pelo Brasil
(Beck, por exemplo), ganhar rios de dinheiro, faturar um Grammy...
Tudo isso, é claro, a Folha vai ter de cobrir. E, aí sim, terá razão.
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