São Paulo, segunda-feira, 05 de março de 2007

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Álvaro Pereira Júnior - cby2k@uol.com.br

CSS e Coldplay navegam no hype

NA SEMANA PASSADA, o Folhateen deu reportagem de capa para a banda paulistana Cansei de Ser Sexy. Com ajuda do computador quântico inaugurado mês passado no Canadá, calculei que essa foi a 106.575 vez que a Folha publicou um texto festivo e favorável a esse grupo brasileiro que faz muito sucesso no circuito indie europeu.
Ainda na semana passada, duas resenhas sobre os shows do Coldplay em São Paulo chamaram a atenção. Uma de Sylvia Colombo, na Ilustrada, outra de Luís Antônio Giron, no site da revista "Época". Ambas exemplares destoantes do clima de quermesse e oba-oba que reina em nossa imprensa cultural. Eram críticas demolidoras, e muito bem fundamentadas, à banda de Chris Martin. "Sessão arrastada de lamúrias coletivas", disparou a Sylvia. "Estilo semigospel", avaliou Giron.
No início de seu texto, Giron reclamou do entusiasmo com a que imprensa paulistana, especialmente a on-line, embarcou na onda dos fãs e se ajoelhou diante do Coldplay. E alertou: "O entusiasmo da platéia não tem nada a ver com o que se passa de fato no palco".
Essa observação nos leva de volta à cobertura laudatória que cerca cada passo do Cansey de Ser Sexy. A banda é o máximo porque o público vibra loucamente. A banda é o máximo porque a imprensa indie britânica a eleva aos céus. Objeto e meio se dissolvem num plasma indistinguível. A música? Quem se lembra dela?
É delicado, neste momento, falar de CSS. Não quero me juntar à legião de invejosos que não aceitam o sucesso da banda e, mesquinhamente, ficam daqui do Brasil torcendo contra. No ano passado, quando as meninas saíram para a turnê americana, dei meus parabéns e escrevi que só isso -tocar em clubes bacanas dos EUA- já era mais do que qualquer banda independente brasileira tinha conseguido.
Mas a excursão americana era só o início. O CSS aconteceu mesmo na Europa. Com os contatos certos e muita disposição, a banda caiu nas graças da máquina de hype: o semanário "NME", a revista "Les Inrocks" e mesmo a grande imprensa de Londres simpatizaram com o CSS. Os reflexos não demoraram a chegar ao Bananão (obrigado, Ivan Lessa).
Tudo isso, é claro, acompanhado pela Folha da maneira mais superlativa. A turnê americana pelos EUA foi tratada como glória absoluta (escondida lá embaixo num texto, a informação de que um show chegou a ser cancelado por falta de público). A chegada à Europa foi descrita de modo não menos triunfal.
Curiosamente, na reportagem do Folhateen, vemos que a Warner quer relançar o primeiro disco do CSS, agora com um esquema mega. Mas para que isso, se, como nos ensina a imprensa brasileira, o jogo já está ganho, EUA e Europa só falam no CSS, só pensam no CSS?
Vou explicar: porque o sucesso do CSS, embora real, inédito e legítimo, é menor do que pode parecer, visto aqui do Brasil. O CSS, por enquanto, bombou no circuito indie europeu, não muito mais do que isso. Algumas críticas publicadas, especialmente nos EUA, foram bem negativas, destacando a falta de nuances do vocal da Lovefoxxx, a pouca coesão das composições, a produção simplória, as letras infantis e o fato de o som ser bastante derivativo de Tom Tom Club e Le Tigre, para ficar só em dois exemplos (e para usar uma palavra branda, "derivativo").
É claro que tudo isso pode mudar: eles podem arrebentar nos festivais europeus de verão, podem ficar famosos no mercado que interessa (os EUA), tocar no programa do David Letterman, abrir a turnê de um artista grande com simpatias pelo Brasil (Beck, por exemplo), ganhar rios de dinheiro, faturar um Grammy...
Tudo isso, é claro, a Folha vai ter de cobrir. E, aí sim, terá razão.


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