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COMPORTAMENTO
Amiga é coisa pra difamar?
Fofocas, intrigas e traições entre amigas fazem parte do cotidiano feminino; meninas são mais cruéis entre si ou isso é preconceito?
CHICO FELITTI
DA REPORTAGEM LOCAL
"Pelo menos meu
ficante não pegou minha prima!", ouviu Serena*, 13, de sua melhor amiga,
no mês passado.
Boa parte da escola, em Caçapava (SP), também escutou a
frase, dita ao microfone do karaokê de um festival estudantil.
Serena chorou na hora, mas,
hoje, admite ter tido alguma
culpa: minutos antes da revelação, havia dito à amiga que sua
imitação de Ivete Sangalo em
"Sorte Grande" (aquela da
"poeeeira") havia sido péssima.
"Parece que sou um ímã de
traíras!", reclama. "Se bem que
toda as meninas são um pouco
assim." Com essa ponderação,
voltou às boas com a amiga.
Casos como esse, de traições
e brigas entre amigas, são corriqueiros em relatos de garotas
e são sucesso na ficção.
Vide "Gossip Girl", que já
vendeu mais de 4 milhões de livros ao redor do mundo e virou
série de TV, mostrando a vida
da "menina-fofoca" do título,
que usa a internet, o celular e a
sua identidade secreta para divulgar viralmente histórias de
traição da turma -seu blog vira
campeão de acessos.
Nos EUA, versões romantizadas da crueldade de moças
contra suas semelhantes dividem vitrines de livrarias com
obras de autoajuda que servem
como "antídoto" para o disse-que-disse da vida real.
Títulos como "Odd Girl Out",
que significa algo como "fora,
garota diferente" e que ficou
entre os mais vendidos do
"New York Times" por três meses, ensinam como se livrar da
vilania de amigas.
Baixa estima
"Enquanto os meninos batem uns nos outros, as meninas
provocam outras lesões, invisíveis, como acabar com reputações", afirma Patrícia Guillon,
psicóloga da PUC-PR (Pontifícia Universidade Católica).
Guillon analisou as agressões
femininas em colégios brasileiros e aponta que é mais difícil
escapar da violência relacional,
que rola entre amigas.
"A violência relacional é uma
punição gratuita que uma menina impõe à outra. Quem não
tem comportamento igual ao
do grupo vai passar de amiga a
objeto de chacota", diz.
Segundo ela, são problemas
de autoestima que fazem garotas se maltratarem sorrindo e,
às vezes, sem consciência.
Já os problemas das vítimas
podem ser mais externos do
que os de autoestima. Que o diga Blair*, 16, de Natal (RN).
Quando a melhor amiga dela
terminou o namoro, passou a
atormentá-la. "Essa "mina" cismava que eu dava em cima do
moleque, mas juro que não!".
Num acesso de raiva, a colega
enciumada acessou o fotolog de
Blair, imprimiu três fotos em
que ela aparecia fumando e bebendo e colou-as pela escola.
A coordenadora viu e chamou a mãe de Blair. "Não deu
em nada, porque as fotos eram
idiotas, que nem essa "mina",
que devia estar de TPM."
Só que não dá para jogar a
culpa de todos os atos nos hormônios, segundo o hebiatra
(médico especializado em adolescentes) Maurício Lima, do
Hospital das Clínicas de SP.
"Hormônios como o estrógeno e a progesterona mudam
bastante o humor das meninas
na puberdade, mais do que
acontece com os meninos. Mas
não enlouquecem ninguém."
Cai aí a teoria de que a falsidade feminina vem do berçário.
Maldade
Katie*, 18 anos e dois namorados roubados por "amigas",
não culpa as colegas. "Se elas fizeram cachorrada, eles foram
ainda piores, porque deveriam
gostar mais de mim!."
Em um dos casos, inclusive, a
amiga abriu o jogo e falou sobre
a paixão adúltera, chorando.
O então namorado de Katie
nada disse nem a atendeu
quando ela ligou -para xingar.
"Meninos também sabem ser
mentirosos quando querem."
Foi o que constatou o sociólogo Noel Card, da Universidade do Arizona (EUA). Ele cruzou os resultados de 148 estudos sobre violência realizados
com 73 mil teens dos EUA, nos
últimos dez anos, e descobriu
que... garotos fofocam.
Eles têm uma tendência duas
vezes maior de partir para a
violência física, se comparados
às meninas, mas também sabem usar modos "mais sutis",
como mentir para os amigos.
"Se não fosse de mau gosto
comparar a um jogo, eu diria
que as equipes estão empatadas. É preciso acabar com a
imagem de que meninas nascem más", disse à Folha.
Se a maldade velada fosse ligada aos cromossomos XX,
uma escola só de meninos não
deveria ter fofoca, certo?
"Fofoca aqui tem de monte!
Os caras sempre inventam
umas histórias uns dos outros",
diz Dan*, 15, que estuda em um
renomado colégio masculino.
* Todos os nomes foram trocados por personagens dos livros "Gossip Girl"
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