São Paulo, segunda-feira, 08 de maio de 2000


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Guitarrista e assassino, Billy Corgan mata o rock and roll

ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
Colunista da Folha

"O formato do rock and roll está esgotado. Como músico, tenho a obrigação de buscar novos caminhos, novas saídas."
A morte do rock como nós o conhecemos já foi anunciada centenas de vezes (várias delas nesta coluna), mas, agora, o coveiro merece especial atenção: é Billy Corgan, líder dos Smashing Pumpkins, uma das bandas mais famosas e cultuadas do mundo.
Corgan fez o anúncio fúnebre em entrevista a Howard Stern, o radialista que há mais de dez anos domina as manhãs americanas com seu humor cortante e muitas vezes grosseiro.
O programa de Stern tem também uma versão para a TV, que passa no canal "E!", aqui dos EUA. E foi essa emissora que apresentou na semana passada a entrevista com Corgan.
Nem era coisa recente. Tratava-se de uma reprise da época em que os Pumpkins estavam lançando o álbum "Adore", de 1998.
Mais um ponto para Corgan, que prova ser capaz de enxergar longe.
Tudo começou quando Stern, depois de passar várias cantadas na namorada do músico, a fotógrafa ucraniana Yelena, perguntou o que Corgan achava dos fãs.
O guitarrista se disse decepcionado, sentindo falta de apoio do público, que parecia não aceitar que o rock do tipo grunge, capitaneado por bandas como os próprios Pumpkins e o Nirvana, nada mais tinha a dizer.
Um ouvinte ligou xingando, e Corgan disparou: "Em 1988, ninguém, ninguém mesmo, tocava pesado, exceto nós e as bandas de Seattle. Todo mundo dizia que éramos loucos, que estávamos querendo ressuscitar o Led Zeppelin e aquilo não ia levar a lugar nenhum. Só que, logo depois, o grunge explodiu, e provamos que estávamos certos. Pois agora estou dizendo que o rock está esgotado, e chegou a hora de buscar outros rumos".
Com o apoio de Stern, que normalmente não deixa seus convidados falar muito, Billy Corgan lembrou que, no fim dos anos 60, Chuck Berry já falava da estagnação do rock, até que os Beatles chegaram, elevando a coisa a um outro plano. Na opinião do líder dos Smashing Pumpkins, seguiu-se, então, uma nova fase de letargia, quebrada pelo Led Zeppelin, que foi sucedido por mais pasmaceira, até a vinda do punk, que mudou tudo de novo etc. etc.
Para ele, os sons realmente inovadores vêm, hoje, da música eletrônica. "Mas, como meu negócio é rock, acho que é meu papel tentar trazer novidades para o tipo de música de que eu gosto."

Também podemos entender as palavras de Corgan como um grito desesperançado contra os fãs conservadores.
Por irônico que pareça, a grande massa dos fãs de rock, um tipo de música normalmente associado a rebelião e inconformismo, é incrivelmente apegada a seus gostos e não quer saber de mudança nem de críticas a seus deuses de vinil.
Na semana passada, por exemplo, "Escuta Aqui" comentou uma lista dos cem momentos mais ridículos da história do rock, segundo a revista inglesa "Q". Tinha desde o cantor cristão Pat Boone virando metaleiro (51º lugar) até o inaudível álbum "Metal Machine Music", de Lou Reed (13º).
Havia, claro, várias menções a grandes nomes do rock progressivo, o que foi suficiente para disparar a ira de fãs do gênero.
Um deles me enviou um longo tratado sobre a "genialidade" do tecladista Rick Wakeman, contemplado com a segunda colocação, por um show de 1975, no estádio de Wembley, em Londres, com uma orquestra completa, coral de 48 pessoas e 26 figurantes vestidos de cavaleiros do rei Artur.
Segundo esse inconformado leitor, o tal concerto nada teve de ridículo e representou na verdade o ápice da carreira do artista.
O curioso é que a "Q" traz um comentário do próprio "gênio" Rick Wakeman sobre o show que o fã brasileiro levou tão a sério. Diz Wakeman: "Fazia um frio desgraçado, mas ainda bem que tínhamos bebido tanto que nem deu para sentir nada".

No Brasil, terra em que os variados ritmos locais têm muita força e dominam as paradas, ser "roqueiro" implica uma certa dose de esquisitice. O "roqueiro" é o revoltado, o cara bem louco.
Engraçado, mas aqui nos EUA não rola nada disso, pela boa razão de que o rock impera, e, portanto, todo mundo é "roqueiro": do tiozinho da casa em frente ao skatista doidão que passa de cabelo azul e camiseta do NOFX.
Acima do Equador, o rock das massas não tem nada de rebelde.


Álvaro Pereira Júnior, 37, é jornalista e mora em San Francisco. E-mail: cby2k@uol.com.br.

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"Sweet Surrender", Bellatrix
Saudade dos Sundays? Não aguenta mais esperar pelo novo do Portishead? Então, acalme-se com este compacto do quinteto islandês Bellatrix (quatro meninas e um cara), agora baseado em Londres. Docinho e moderno, para baixar em MP3 e dar de presente.

"Nothing as It Seems", Pearl Jam
A nova balada do Pearl Jam já toca nas rádios, depois de muito mistério. De novo, uma canção naquele tom desesperado que é a marca do PJ nos últimos anos. Bonito, mas parece vir de um passado que não quer dizer mais nada. Para saudosistas.

Los Hermanos e seus fãs
Difícil apontar o que é pior: se os fãs de Los Hermanos, que só querem saber de "Anna Júlia", ou se a própria banda, que tem certeza de que o restante do álbum é hardcore. Devo ser uma das únicas pessoas no mundo que ouviu aquilo inteiro. Não dá.


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