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Hong Kong é um mix de modernidade, caos e poluição
ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
COLUNISTA DA FOLHA EM HONG KONG
Nas ruas pegajosas de fuligem e umidade, ninguém na
multidão parece ter mais de 22 anos, e nenhum telefone celular (dezenas por metro quadrado) mede mais
de 6 cm de comprimento. Por que tantas pessoas falam
em telefones móveis e o que dizem é um mistério para
ocidentais siderados, vagando pelas ruas desta cidade
onde acabam de pousar?
São 2h da madrugada de sexta para sábado em Wan
Chai, bairro de vida noturna intensa em Hong Kong, 6,8
milhões de habitantes em pouco mais de 1.000 km2. Mas
bem poderiam ser 14h em uma rua movimentada do
centro de qualquer metrópole do planeta. Mal se consegue dar dois passos sem esbarrar em alguém. A multidão caminha impaciente, e "multidão", aqui, é palavra
que ganha outro significado, mais ansioso, urgente.
Ônibus de dois andares passam a milímetros do meio-fio, lotados, soltando monóxido de carbono em níveis
há muito banidos no Primeiro Mundo.
Anestesiado por algum coquetel químico, um mendigo de moletom vermelho ronca, jogado na calçada ao
lado da fila de um ponto de ônibus. Apesar do sono, a
mão esquerda segura um telefone celular.
Numa escala de um a dez, a música escapa em volume
12 das casas de karaokê. Que, aliás, não são exatamente
casas. São prédios inteiros, intensamente iluminados,
interconectados por passarelas, onde elevadores panorâmicos transportam milhares de anônimos com vontade de cantar, fumar e beber até cair. Aqui, karaokê
não é experiência coletiva. A cantoria acontece em pequenas salas (cada prédio tem dezenas delas), que os
"artistas" alugam por um determinado tempo.
De volta às ruas, o ar tem cheiro de maresia e fritura.
Barracas de comida, uma ao lado da outra, oferecem
iguarias, espetinhos de conteúdo ainda desconhecido.
Por incrível que pareça, Wan Chai é também um bairro
residencial. Milhões moram nas mesmas ruas da música ensurdecedora. As roupas estendidas do lado de fora
das janelas são a prova: famílias tentam viver ali.
A língua é um pesadelo. Fala-se o dialeto cantonês,
idioma dos chineses do Sul ainda mais intrincado que o
mandarim, a língua oficial (usada em Pequim). Mais do
que palavras ou sílabas, o que importa em cantonês é o
tom. Uma mesma palavra, com pequenas variações tônicas, pode significar "seda", "leão" ou "particular".
Nos táxis e serviços em geral, inglês inexiste. Desde que
HK foi devolvida pelos ingleses à China, em 1997, o uso
do idioma colonial entrou em humilhante decadência.
Wan Chai, Tsim Sha Tsui, train station, Kowloon, yes
yes yes, no no. Seja o que Deus quiser.
Álvaro Pereira Júnior, 37, é jornalista e mora em San Francisco. E-mail: cby2k@uol.com.br
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