São Paulo, segunda-feira, 12 de maio de 2008

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livro

diários de resistência

"Vozes Roubadas" reúne 14 diários escritos durante conflitos por adolescentes e crianças

LUANA VILLAC
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Em 1918, quando a alemã Piete Kuhr tinha 16 anos, ela escreveu as seguintes palavras: "Logo concluirei meu diário de guerra. Será o último diário de guerra que escreverei na vida, pois jamais pode haver outra guerra, jamais". Terminava a Primeira Guerra Mundial, e a menina nem imaginava que o mundo ainda se chocaria com os horrores da Segunda Guerra e de muitos outros conflitos que explodiriam ao redor do globo nas décadas seguintes.
O diário de Piete é o primeiro da coletânea "Vozes Roubadas", que reúne 14 diários de guerra escritos por adolescentes ou crianças do início do século 20 ao começo do 21. Longe das estatísticas e das imagens pirotécnicas sem identidade que vemos na televisão, esses relatos pessoais revelam de forma tocante como é ter o cotidiano subitamente invadido por uma realidade de violência.
"Eu pensava que as guerras aconteciam às outras pessoas", afirma Zlata Filipovic, nascida em Sarajevo. "Mas elas realmente acontecem a pessoas como nós -pessoas com esperanças, desejos e problemas."
Zlata é uma das organizadoras do livro, ao lado da escritora inglesa Melanie Challenger. Ela ficou conhecida quando o diário que manteve de 1991 a 1993 foi publicado e alertou o mundo para as atrocidades da guerra da Bósnia.
As duas se encontraram pela primeira vez em Amsterdã, na casa onde Anne Frank -a mais famosa diarista da história- redigiu as páginas que a tornariam um símbolo das vítimas do Holocausto. Hoje o local é um museu, e Zlata, que tem mestrado em estudos da paz internacional, milita pela causa pacifista.
"Imaginamos um livro que reconstituísse o caminho da guerra através do século conforme esta invadia a vida de criança após criança", explica Melanie.
"Ao conhecer as pessoas que a vivenciaram e cresceram em meio a ela, podemos dividir o conceito da guerra em pedaços menores e começar a entender o que ela significa", diz Zlata. "Talvez assim possamos perceber também que os jovens cujos escritos e cuja vida estamos conhecendo dividem uma humanidade comum, que transcende cultura, credo e geografia."
Os registros selecionados trazem diferentes olhares sobre o cenário bélico: tanto jovens que lutaram no front quanto os que vivenciaram os conflitos em cidades, vilarejos, esconderijos e guetos falam de seu desespero e de suas esperanças.
Nem todos os autores sobreviveram ao que enfrentaram. Mas suas vozes permanecem registradas nesta obra.

VOZES ROUBADAS
Zlata Filipovic e Melanie Challenger (trad. Augusto Pacheco Calil)
Cia. das Letras
R$ 37 (376 págs.)


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