São Paulo, segunda-feira, 17 de maio de 2004

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O som que fugiu do quintal

Depois de um tempo sumido, pagode volta a cair no gosto dos jovens e cria tribo de fãs do estilo

DA REPORTAGEM LOCAL

O pagode, estilo musical que estourou no Brasil há pelo menos uma década, está de volta, só pra contrariar. Longe de ocupar um fundo de quintal, o gênero atrai milhares de jovens de alto poder aquisitivo, cheios de molejo, para casas noturnas do bairro da Vila Olímpia, em São Paulo, dividindo espaço com clubes de música eletrônica estrangeira.
A arte do samba romântico voltou a ser popular, juntando morenos e loiros no mesmo passo, vestidos com roupas de marcas caras e dispostos a enfrentar filas e a gastar até R$ 80 em baladas que começam com música eletrônica e black e terminam em pagode ao vivo, tocado por grupos formados por universitários.
É terça-feira na casa noturna Armazém da Vila, com capacidade para 3.000 pessoas. A noite é fraca, mas junta 1.300 neopagodeiros, que encararam o frio para suar a camiseta ao som do grupo Inimigos da HP, octeto formado por cinco engenheiros, um desenhista industrial, um administrador e um publicitário.
"Gosto do Inimigos da HP porque eles tocam o que a gente quer ouvir", conta a estudante de publicidade Luana Bittencourt, 20, que trabalha como vendedora de uma loja de grife. "Acho que o perfil do público é bem eclético, que curte um pouco de tudo. É legal porque resgata um estilo que estava esquecido."
Nem todo mundo que freqüenta as noites de pagode gosta do estilo musical. "Essas bandas não estão com nada. Curto mesmo Bezerra da Silva e Zeca Pagodinho. Vim aqui atrás das patricinhas. Pagode não é a minha praia", diz Eduardo Morandini, 22, formado em direito.
Quem também estava lá por causa da "mulherada" era o estudante de direito Robson Pitta, 21. "Não é pagode de raiz, é mais voltado para a balada", diz Robson, que acha o gênero modismo. "A tendência é rolar outra onda. As pessoas vêm mais pelo ambiente e pela azaração."
Gabriela Cysneiros, 19, estudante de marketing, curte pagode desde que tinha 13 anos. "Eu adoro o estilo, mas acho que as pessoas vêm para fazer uma social. Só fica cheio pela balada e porque há muita mulher e homem bonitos."
Como cerveja, caipirinha e vodca com energético (a R$ 12, em média) rolam a noite inteira, a entrada de menores de 18 anos é proibida, o que não impede que a galera curta o pagode em casa.
José Guilherme Salatino Trivellato, 17, diz que voltou a gostar de pagode no ano passado, por causa da moda. "Quando fui ao Rio, vi que há muito boteco que toca sambas mais antigos. Não gostei muito. O pagode atual é mais animado. Esses sambas de raiz são mais para relaxar."
Para a namorada dele, Leticia Mont Serrat Barbosa de Almeida, 17, o pagode de hoje não é brega. "É muito legal, é um show com banda. Acham que são dez caras de óculos tocando pandeiro."
Ela acha que o gênero mudou muito de uns tempos para cá. "Antes o pagode era diferente, uma coisa de os grupos irem tocar no programa do Faustão, do Gugu. Hoje virou balada, todo mundo cantando junto. Acho que isso aconteceu porque abriram espaços para o pagode."
Por causa do pagode, Leticia começou a tocar cavaquinho. "A batida do pagode é um pouco diferente, tiro de ouvido."
Se o modismo vai passar ou não, tanto faz. Pelo menos para Maria Carolina Casadevall Gonzaga, 16. "A moda existe, mas gostar ou não é uma opção de cada um. Eu vou continuar gostando mesmo quando não estiver mais na moda."
(ALESSANDRA KORMANN E LEANDRO FORTINO)


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