São Paulo, segunda-feira, 17 de junho de 2002

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EDUCAÇÃO

Músicos de rap passam suas mensagens em sala de aula

Ritmo com poesia dá boa química

André Sarmento/Folha Imagem
O rapper e professor de química Pablo Damasceno


FERNANDA MENA
DA REPORTAGEM LOCAL

Não tratar como diferentes as combinações dos mesmos elementos. A fórmula adotada por Pablo Soares Damaceno, 27, em suas duas profissões pode ter sua eficácia testada através do CD "Estratégia", seu disco de estréia sob o nome de Professor Pablo.
Pablo é rapper, vive no Capão Redondo, uma região com altos índices de desemprego, violência e pobreza da periferia de São Paulo, e, desde os 19 anos, é professor de química em colégios particulares de classe média alta da capital.
"Trabalho com formação tanto na sala de aula quanto no rap. O tipo de música que proponho é positiva, mostra um caminho, incentiva e instiga quem me ouve. E essa também é a proposta do educador. Vejo as duas coisas de forma muito próxima", explica.
Em seu bairro, a quantidade de jovens desempregados, que não estudam ou que estão envolvidos com o crime e com as drogas é de perder a conta. Mas, entre os 200 alunos com os quais Pablo troca experiências (não só de química), é muito fácil contar o número de estudantes negros: apenas dois.
"O grau de oportunidades de um jovem negro da periferia é muito menor, mas isso não é algo a ser simplesmente aceito", contesta. "Já é esperado pela sociedade que um jovem do Capão pare de estudar e caia na criminalidade. E as pessoas vestem essa carapuça e desistem de tentar. Meu esforço foi grande. Saía da escola de noite às 23h, chegava em casa à 1h e tinha de acordar às 4h para trabalhar. Assim, contrariei o que era esperado de mim."
Pablo já trabalhava como professor quando começou a fazer música e acredita que educar o mano da periferia através das letras do rap é tão importante quanto trocar informações com os jovens bem-nascidos dos colégios em que leciona.
Mas quem não tem um professor-rapper também pode tomar contato com a crítica social desse gênero de forma direta. A gravadora Trama, em parceria com a Coordenadoria Especial da Juventude e com as Secretarias Municipais de Cultura e de Educação, criou o Escola de Rap. O projeto leva DJs, rappers e grupos de hip hop a escolas da rede pública e privada para estimular a integração social de jovens da periferia.
Rappin Hood, que integra o projeto, acredita que o rap é, sim, um instrumento de educação. "O rap trata das questões políticas e sociais do Brasil e ainda da violência, da criminalidade e do preconceito. E, em um sentido geral, o rap educa há muito tempo", defende.
DJ Marcelinho, ex-integrante do Câmbio Negro, participa da iniciativa e acredita que o rap possa ser usado como um instrumento de educação social e de respeito ao próximo, coisas que nem sempre são abordadas com facilidade por professores. Isso sem falar no rap como profissão. "Dou workshops com o básico da atividade de DJ, que cresceu muito e tem um bom mercado de trabalho hoje em dia", explica.
Hood, que já realizava esse tipo de visita às escolas com apoio do Centro de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente, concorda com Pablo quando o assunto é falar para o público de periferia ou de classe média. "É importante atingir os caras com maior poder aquisitivo. Isso pode ajudar a formar alguém mais respeitoso e consciente da pobreza e da discriminação."
"Muitos moleques não prestam atenção ao que sua mãe, seu pai ou seu professor dizem. No entanto, ouvem as letras de rap e entendem nossa mensagem. O cara acaba tomando uma dura sem nem mesmo perceber", brinca.



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