|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Como um coração brasileiro pode se tornar afegão em 78 páginas
A leitura recomendada hoje começou numa livraria. Eu estava ali, à
procura de um bom livro, e dei de
cara com uma faixa vermelha em
torno de um volume pequeno na
qual se lia o seguinte: "Se você puder
ler somente um livro do Oriente este
ano, que seja este. Um prodígio".
Comecei a ler ali mesmo, curioso,
mas logo vi que não havia nada de
exótico, de trivial no livro, que se
chama "Terra e Cinzas", vem apresentado como "um conto afegão" e é
de autoria de Atiq Rahimi.
E o longo conto é um soco na boca
do estômago. É um texto mais ou
menos fragmentado, que a gente lê
sem soltar. Enredo básico: num confim do atormentado Afeganistão
(ocupado pelos soviéticos, duas tragédias atrás), um velho espera uma
carona para visitar seu filho. Com o
velho, seu único neto. Neto que ficou
surdo por causa de bombas que explodiram perto dele. O resto da família: todos mortos.
O velho quer avisar seu filho sobre
o que ocorreu -porque o filho já está há meses fora- e pensa que teria
sido melhor ele mesmo ter morrido.
Quase nem precisa dizer mais nada para avaliar o tamanho do horror
ali descrito, que é nosso contemporâneo apesar de distante na geografia. A narrativa é delicada, sutil, feita
por um narrador que fala diretamente com o velho, em segunda
pessoa, num processo raro e bem
tramado. O resultado é que nosso
coração, aos pedaços, fica afegão.
E-mail: fischerl@uol.com.br
"Terra e Cinzas - Um Conto Afegão"
Autor: Atiq Rahimi
Tradução: Flávia Nascimento
Editora: Estação Liberdade
Quanto: R$ 18
Texto Anterior: Folhateen explica Próximo Texto: Eu leio Índice
|