São Paulo, segunda-feira, 20 de novembro de 2006

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

movimento

Estilo chega à universidade

COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

"A juventude de classe média quer falar igual a gente, vestir, dançar igual, só não quer ser a gente, ter a nossa vida. Nem nós queremos a deles. Nós sabemos nos divertir sem grana, eles não. Queremos apenas ampliar nosso campo de trabalho, ganhar dinheiro com isso." A afirmação de Thaíde ganha respaldo em vários estudos acadêmicos que vêem no movimento do hip hop nacional uma força de proporções ainda subestimada.
"O rap colocou a periferia na moda", afirma Pedro Guasco, antropólogo da USP e autor de tese de mestrado sobre o assunto. Na análise do pesquisador, esse é um dos resultados da exaltação da origem negra, pobre e de periferia, não só nas letras, mas também na estética das roupas, acessórios, cabelos.
A ênfase nesses elementos de origem, segundo ele, trouxe à tona e construiu uma identidade que é motivo de orgulho. "É uma forma de inverter o discurso dizendo "se o lugar de onde venho é tão ruim, então quem vem desse mundo tem capacidade e valor; é um herói"."
Vários aspectos da qualidade da produção artística e de críticas do rap são abordados pelo meio acadêmico. Segundo alguns desses estudos, a violência como tema provoca uma equivocada interpretação.
"Quem ouve só uma parte da letra pode dar um sentido diferente. É verdade que eles narram muito o tema, mas a apologia ao crime não está ligada aos fundamentos do rap. Os grupos que defendem a violência não andam junto com eles nem são bem aceitos pelos mais politizados", diz Guasco.
Afora isso, há o componente artístico de grande peso na propagação das mensagens. "Há uma construção tão rica, a condição psicológica dos personagens, a forma como as histórias vão se cruzando, toda uma ambientação sonora de fundo muito bem preenchida, que parece uma experiência cinematográfica", observa Guasco.
Ele cita a faixa "Tô Ouvindo Alguém Me Chamar", do Racionais, em que há um encaixe perfeito da letra com os sons de fundo, como a batida do coração do personagem que conta a história.
Para Bruno Zeni, mestre em teoria literária pela USP, "a denúncia do Racionais MCs não poderia ser mais grave: "Nós, pretos e pobres da periferia, vivemos segundo a lei da selva, lei que, apesar de absurda e violentadora, já foi incorporada à cultura brasileira, em que é normal ver os negros pobres presos ou mortos'".
A história do movimento está apenas começando a ser organizada em estudos que comportam diversas áreas do conhecimento, como a sociologia, a antropologia, a pedagogia, a psicologia, o jornalismo e as letras. "A abrangência de abordagens e de enfoques dá a medida da riqueza e da complexidade do fenômeno", diz Zeni. (DB)


Texto Anterior: Movimento: Baladinha hip hop
Próximo Texto: Frases
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.