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GRAFITE
Garotas grafiteiras ganham respeito em uma atividade dominada por
homens e usam a internet para debater, organizar eventos e trocar experiências
Elas pintam o sete
Renato Stockler/Folha Imagem
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Eduarda dos Santos, 12, durante aula de grafite |
FLÁVIA MANTOVANI
DA REPORTAGEM LOCAL
Quando tinha 19 anos, Ana Clara
Marques decidiu entrar para uma
oficina de grafite. Ao perceber que
só havia meninos, chamou algumas amigas
para aprenderem junto com ela. Hoje, aos
26, ela dá aula de grafite para adolescentes
da cidade de Santo André (grande São Paulo), onde mora. Desta vez, a turma é mais
dividida: metade dos alunos são meninas.
Aos poucos, as mulheres estão entrando
nesse território onde praticamente só há
garotos. É só prestar atenção nos muros
das grandes cidades para ver que pseudônimos femininos, como Tika, Miss, Nia e
Prima Donna, são cada vez mais comuns.
"As mulheres estão aí, batendo cabeça
para se afirmar. Mas somos minoria", diz a
grafiteira carioca Marcela Zaroni, 26. Conhecida como Prima Donna, ela criou em
2002 a primeira crew (grupo de grafite) feminina do Rio de Janeiro, a TPM Crew.
Três anos antes, Ana Clara Marques havia criado com as amigas outra crew com
um nome tão feminino quanto o das cariocas: a Só Calcinha, que chegou a ter 11 integrantes. A crew não existe mais, mas Ana
Clara ainda assina o nome nos desenhos.
Ela e Marcela fazem parte de um grupo
que está empenhado em reunir as grafiteiras do país. Para isso, decidiram usar a internet. Em outubro, criaram uma lista de
discussão que tem, até agora, 34 participantes. "Com certeza, são muito mais. Nem todas têm acesso à rede", diz Marcela. Fotologs e uma comunidade no Orkut também
ajudam a trocar fotos e idéias.
Segundo a psicóloga Viviane Mendonça,
que fez seu doutorado na Unicamp sobre
as meninas grafiteiras, não só o hip hop
mas as culturas juvenis em geral -como o
rock e o punk- são tidas como masculinas. "As meninas curtem, mas nos bastidores. As que fazem realmente são poucas, e
pouco é falado sobre elas." Para Viviane, a
participação no grafite ajuda as meninas a
se afirmarem enquanto mulheres de periferia. "Elas passam a questionar a participação feminina na sociedade."
Ana Carolina Rego, 18, a Tika, que grafita
desde os 16, diz que a atividade muda as
mulheres. "É carregar peso, andar o dia todo, sujar a cara e o cabelo de tinta. Não dá
pra ter tanto aquela coisa de menininha."
Marta Oliveira, 18, que começou a grafitar junto com Tika, acha que dá para perceber um toque feminino nos desenhos. "É
mais sentimental, mais delicado. As meninas fazem muitos personagens, a maioria
mulher", diz ela, que assina Miss.
Segundo as grafiteiras, não dá para generalizar. "Tem muito garoto pintando bonequinha, usando rosa.
Cada ser humano tem o
seu trabalho", diz Marcela. Janaína Gonçalves, 26, a Jana Joana, diz
que gosta de abordar
temas femininos, como
a maternidade.
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