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Pixies ao vivo, lembranças embaçadas
ÁLVARO PEREIRA JÚNIOR
COLUNISTA DA FOLHA
Os Pixies vêm tocar no Brasil (Curitiba) em maio, e isso traz lembranças formidáveis. Vi os caras ao vivo
no auge da forma, em Boston, em
1990, última apresentação da turnê do
fenomenal "Doolittle", segundo álbum do grupo. O que lembro do
show você vai saber daqui a pouco.
Por enquanto, vamos explicar aos
mais jovens e àqueles que não acompanham o rock de perto quem foram
e o que fizeram os Pixies.
Sabe aquela história de que o Nirvana estraçalhou o muro que separava o
mundo "mainstream" do mundo alternativo? Pois então. Foram os Pixies
que deram a primeira marretada nessa parede, na segunda metade dos
anos 80. O muro não caiu, mas ficou
balançando. Isso facilitou muito o
golpe de misericórdia nirvânico, que
seria desferido poucos anos depois.
Os Pixies surgiram no campus de
uma universidade meia boca, a Universidade de Massachusetts. Ou seja,
eles não só faziam música para um
público universitário como eram o
próprio público universitário. Formavam os Pixies Black Francis (que
depois virou Frank Black, vocais e
guitarra), Joey Santiago (guitarra),
Kim Deal (baixo) e David Lovering
(bateria). Acabaram em 1992 e voltam agora na formação original.
Os Pixies foram pioneiros no estilo trecho
calmo-trecho barulhento-trecho calmo, adotado sem reservas, depois, pelo Nirvana e por
dezenas de outras bandas. As letras absurdas
sobre extraterrestres, animais e outros temas
incomuns alçavam os Pixies a um nível de inventividade poética sem paralelo na época.
Sem os Pixies, não teria existido o grunge e
não existiria o Weezer (o grupo americano
mais imitado no Brasil).
Beleza? Deu para se ligar na importância?
Agora, ao tal show de que falei lá em cima.
Quer dizer... antes do show em si, uma outra
história curiosa. Em 1989, eu estudava em Boston, não conhecia ninguém e dividia um apê com um tiozinho holandês que só escutava música clássica e Stevie Wonder.
Sem ter o que fazer nos fins de semana, ouvi que uma rádio bacana, a
WFNX (existe até hoje), promovia
festas em um clube chamado Axis.
Os DJs eram os próprios locutores.
Em um sábado gelado, baixei no
Axis, escutei o que, na época, era a
melhor música da minha vida (depois descobri que era "Stigmata", do
Ministry) e fiquei chapado quando
rolou a introdução de "Debaser",
uma das canções mais conhecidas
dos Pixies. Pensei: "Os caras são da
área, essa música é superconhecida,
isso aqui vai pegar fogo". Na verdade, "Debaser" esvaziou a pista. Foi
recebida pelo público com frieza
comparável à da neve lá fora...
Mas, então, o show. Era o último de
uma longa excursão, os músicos estavam exaustos. Na época, com 20 e
poucos anos, eu exibia resistência pétrea na área do corpo que os velhos
comentaristas de boxe chamam de
"zona hepática". Sabendo da importância da apresentação, detonei. Resultado: não me lembro de nenhuma
música. Só uma cena ficou gravada:
Kim Deal, a baixista, dando altas cusparadas
no chão.
Mais nada, nenhuma outra
memória. Preciso ver os Pixies
de novo.
Álvaro Pereira Júnior, 40, é editor-chefe do "Fantástico" em São Paulo
E-mail: cby2k@uol.com.br
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