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São Paulo, segunda-feira, 22 de setembro de 2003

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Preta Gil desafia os padrões de beleza atuais ao assumir suas curvas a mais

DA REPORTAGEM LOCAL

Quando estreou como cantora, com o disco "Prêt-à-Porter", lançado no mês passado, Preta Gil -filha do ministro da Cultura, Gilberto Gil- surpreendeu o público não por dar início à mesma carreira do pai, mas por desafiar os padrões de beleza ao tirar a roupa e posar nua para as fotos do encarte de seu CD.
Sem querer, garante Preta, seu disco criou polêmica. Foi alvo de aplausos e de vaias. Levantou discussões sobre as imperfeições do corpo real e evidenciou o preconceito que a estética da magreza embutiu na cabeça de pessoas comuns. Leia, a seguir, trechos da entrevista concedida por Preta Gil ao Folhateen. (FM)
 
Folha - Você sempre foi gordinha?
Preta Gil -
Não. Era uma adolescente normal. Tenho a formação física de uma mulata: com bunda, com coxa etc. Engordei mesmo depois de engravidar, aos 20 anos. Estava casada, acomodada, e minha rotina de trabalho fazia com que eu comesse mal. Engordei muito. Quando me separei do meu segundo marido [Preta já teve três], aos 26 anos, foi que achei que tinha de emagrecer. Estava a fim de um garoto muito bonito e achei que ele só ficaria com uma mulher magra.

Folha - O que você fez?
Preta -
Entrei nesses regimes, tomei bola e fiz essas dietas barra-pesada. Terminei fazendo uma lipoaspiração e emagreci 25 quilos. Pesava dez quilos a menos do que peso hoje [70 kg].

Folha - E você conquistou o cara?
Preta -
Sim. E, aí, ele me disse que, quando eu era mais gordinha, era mais bonita. Isso depois de mil sacrifícios, de eu estar toda mutilada e cheia de plásticas. Foi aí que comecei a repensar essa questão do corpo.

Folha - Seu corpo a incomodava?
Preta -
Não. Mas comecei a achar que o magro é que era bonito. As pessoas viviam me falando: "Preta, você é tão linda. Por que você não emagrece?". Ou: "Poxa, você tem um rosto lindo...". Ai, que podre ouvir isso!!! Claro, meu corpo é gordo, mas nem por isso ele é feio. Fiquei bem, bem magra, só que, nem assim, fiquei feliz. Aquela não era a minha realidade. Não conseguia manter aquele peso. Tomava remédio. E foi aí que comecei a ter uma compulsão por compras.

Folha - Há uma relação entre uma coisa e outra?
Preta -
Olha, é importante que as meninas saibam de uma coisa: remédio para emagrecer deveria ser proibido que nem droga. Entrei na minha compulsividade por causa do remédio, que me deixava ligada, louca. Foi terrível. Ficava com o maxilar travado e a boca seca. Ficava ansiosa e, quando via, já estava brigando com alguém. E acho que foi esse remédio que me jogou na depressão e na compulsividade.

Folha - Como você saiu dessa?
Preta -
Foi com muita terapia. Descobri que seria feliz quando assumisse que queria cantar. Que não há problema nenhum em eu querer ser a mesma coisa que meu pai, porque eu sou diferente dele. Ele tem o dom dele, eu tenho o meu. Eu não sou o Gilberto Gil. Sou um fruto dele, com minhas características e meu colorido próprios. Hoje tenho equilíbrio. Peso 70 quilos e tenho o corpo perfeito. Acho meu corpo lindo porque eu o assumo com todas as suas imperfeições. Tenho que conviver com ele para o resto da minha vida. Tenho de fazê-lo sensual e bonito. Tenho de conquistar os homens com ele também. E o que eu vou fazer? Mutilá-lo de novo? Não tenho o que fazer a não ser aceitá-lo e descobrir sua beleza.

Folha - É. Mas há muita menina que tem uma gordurinha a mais e fica...
Preta -
Aí faltou tapa na bunda quando era criança. É excesso de revista. O que acontece com a menina adolescente? Ela passa na banca e só vê aquelas mulheres lindas. Mas, e daí? Ela vai se identificar com aquilo? Ver aquela modelo esquálida, com o cabelo supersedoso, com a pele maravilhosa, se ela tem espinha e não tem dinheiro para o dermatologista nem grana para a academia... Ou é nordestina e come farinha, dendê e aipim. Ou trabalha muito e precisa se alimentar bem. Não dá para se basear nesse padrão maluco.

Folha - Foi essa a discussão que você levantou com a foto do CD.
Preta -
Tenho recebido várias cartas depois do disco. Acho que é importante a gente botar a boca no trombone. Senão, continuaremos nessa ditadura, continuaremos nos anulando. As mulheres não se assumem como elas são, não só a gordinha, mas a do nariz torto, a da canela fina etc. Não atraímos os outros só pelo físico, mas porque somos bacanas, inteligentes, amigas etc.



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