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O quebra-cabeça das artes
A 20 DIAS DO FIM, BIENAL DE SÃO PAULO DESAFIA JOVENS A DECIFRAR SUAS OBRAS
GUSTAVO FIORATTI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Faça o seguinte teste consigo próprio: vá à Bienal de
São Paulo -em cartaz até o
próximo dia 12 no parque Ibirapuera- e escolha uma
obra. Olhe bem para ela e faça uma leitura a partir de
suas primeiras impressões.
Só depois leia o título
-que sempre fica ali ao lado,
numa etiqueta- e faça então
uma segunda interpretação.
Provavelmente, você vai
se deparar com uma leitura
diferente da primeira.
Último estágio do exercício: converse sobre essa obra
de arte com um dos 300 educadores contratados pela
mostra. Você vai costurar
uma possível terceira leitura.
Obras de arte são como cebolas: "elas têm muitas camadas", diz a curadora de
educação da Bienal, Stela
Barbieri. "Essas camadas podem ser exploradas de muitas maneiras. Informar-se leva a novos entendimentos."
E a palavra "entendimento" pode representar até mesmo um sono profundo.
INTERPRETAÇÃO
Foi isso o que aconteceu
na primeira visita que os estudantes Matheus Rosenfeld,
19, e Jennifer Tanaka, 18, fizeram à obra "Ninhos", de Hélio Oiticica (1937-1980).
Eles dormiram dentro da
obra de um dos mais importantes artistas brasileiros, o
cara que iniciou esse negócio
de instalações, nos anos 60.
A obra tem 28 camas-cabines. Quem quiser deitar para
ler também pode. Só não vale
fazer sexo, o que, segundo
um monitor, quase ocorreu.
A soneca de Matheus e
Jennifer durou meia hora. Na
segunda visita que fizeram,
aí sim, preocuparam-se mais
com a interpretação. "Acho
que essa obra representa
uma pausa na vida", disse
Matheus. "E aqui, na Bienal,
pode ser uma pausa depois
de tanta informação."
De fato, dar um tempo entre um trabalho e outro, na
Bienal, pode ser bom.
A mostra reúne 160 artistas. É muita coisa. Portanto,
conforme-se: não dá para
ver tudo de uma vez.
Mas não precisa se intimidar. Esse é um conselho da
artista Graziela Kunsh. "As
coisas exigem tempo. Não
dá para passar sem paciência por uma obra", diz ela.
O jeito é selecionar. E fazer
o seu próprio mergulho.
ISSO É ARTE?
O estranhamento diante
de algumas obras também
pode levar você a muitos lugares. O que o argentino
Eduardo Navarro, por exemplo, quis dizer com um monte de terra que qualquer um
poderia ter juntado daquele
jeito e dado o nome de arte?
Para compreender essas
coisas esquisitas das artes
plásticas, pode ser bom voltar a um passado próximo.
No início do século 20, um
movimento chamado dadaísmo propôs uma ruptura
com os suportes tradicionais
(pintura e escultura).
Seu mais famoso expoente, Marcel Duchamp, chegou
a expor um mictório num salão de artes. Um ato simples,
que conseguiu contestar toda a rigidez das escolas anteriores. Se aquele produto fabricado em série pudesse falar, provavelmente dali sairia a pergunta: "por que
raios para ser artista é preciso segurar um pincel?"
Uma pergunta leva a outra. E a arte, no fim, navega
nesse turbilhão de dúvidas,
que podem se encerrar em
uma última questão: "A obra
que está na sua frente fez você enxergar algo que não conhecia?", propõe Barbieri.
Observe. E responda você
mesmo.
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