São Paulo, segunda-feira, 24 de junho de 2002

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

EMPREGO

Robôs da montadora Volkswagen são programados por jovens da geração joystick

Garotos comandam "brinquedos" milionários

Fabiana Beltramin/Folha Imagem
Leandro Nishikawa e Evandro Análio, garotos que controlam com joysticks os robôs da fábrica da Volks


DA REPORTAGEM LOCAL

Na adolescência, eles eram aqueles garotos que passavam horas jogando videogame, brincando com carrinhos de controle remoto e fuçando no computador. Um pai desavisado poderia muito bem pensar que o destino natural de seu filho seria mofar num subemprego. Ledo engano.
Hoje, por conta da habilidade no uso do joystick (controle de jogos) e da atenção visual que os videogames proporcionam, existem jovens que estão conseguindo bons empregos.
Na fábrica da Volkswagen, em Taubaté, no interior de São Paulo, vários garotos conseguiram, antes mesmo de fazer 20 anos, trabalhar em áreas da fábrica que pagam um salário bem acima da média para essa faixa etária.
Em comum, eles têm entre as suas tarefas saber controlar os 130 robôs da montadora por meio do joystick e do computador.
Para Marco Aurélio de Castro, 37, gerente de administração e desenvolvimento pessoal da fábrica, esses jovens ganharam espaço com as mudanças tecnológicas. Contudo, para conseguir um emprego como esse, não basta ser apenas um ás do videogame.
Tudo começa pela vontade de estudar. "Por obrigação legal, temos de ter aprendizes de 14 a 16 anos na fábrica. Isso é feito por meio de uma parceria com o Senai (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial). Eles começam a fazer seus cursos de mecânica ou de elétrica e vão adquirindo esse conhecimento", explica Castro.
Quando esses garotos começaram a chegar à fábrica, após passarem esse período como aprendizes, logo foi identificado neles um potencial para mexer com os robôs.
"Percebemos que toda essa garotada tem uma agilidade muito maior. O que demorava muito tempo passou a ser mais rápido pela habilidade dos garotos em lidar com o joystick", comenta Castro.
Na fábrica, o joystick é hoje uma ferramenta fundamental. Para ter uma idéia, 45% dos 6.000 pontos de solda que são necessários para fabricar um carro como o Gol são feitos por robôs.
A programação dos robôs pode ser feita de duas formas. A mais tradicional é ajustá-los por meio de um sistema de coordenadas, feito no computador, o que demanda um tempo enorme.
A outra forma, mais fácil, é traçar os movimentos dos robôs com o joystick e depois fazer os ajustes finos no computador. E é aí que aqueles anos e anos passados jogando videogame começam a valer a pena.
Só que, no trabalho, o conhecimento tem de ir além das habilidades naturais de um viciado em games. "Os garotos não só programam como fazem a manutenção dos robôs. Todos sabem o que têm de fazer para garantir o funcionamento do robô. Sabem mexer com hardware, mecânica e elétrica. Eles não aprendem a jogar, mas a programar o jogo", diz Castro.
Mesmo "jogando" no trabalho, a atividade desses jovens não é brincadeira. "É uma atividade de responsabilidade, mas esses garotos são preparados pelo Senai para ter uma visão profissional muito forte. Aqui não dá para brincar. Qualquer brincadeira pode levar a um risco até físico."
Segundo Evandro Bottossi Análio, 18, que hoje é eletricista eletrônico na fábrica da Volks, a atividade pode ser divertida. Seu trabalho é consertar e fazer a manutenção das partes elétricas e eletrônicas dos robôs, o que inclui programação.
"É divertido usar os robôs. Uma vez me tranquei numa sala com um deles um dia inteiro e fiquei testando as suas funções", diz o garoto.
Evandro credita o seu emprego de hoje às horas de videogame. "Desde os oito anos eu jogava de tudo: jogos de corrida, de estratégia, simuladores de vôo. Era viciado", conta. Hoje, além de trabalhar na Volks, ele cursa o primeiro ano de engenharia em telecomunicações.
Leandro Nishikawa, 22, é outro que diz ter aprendido com os games de corrida e de estratégia. Hoje ele é eletricista de manutenção e passa o dia percorrendo a fábrica sempre que algum dos robôs apresenta problemas.
"Jogava bastante videogame e adorava carrinhos de controle remoto. Hoje não dá mais. Quando tenho tempo, ainda jogo um game de estratégia, como Age of Empires", conta o garoto, que está no quinto ano do curso de engenharia elétrica e divide seu tempo entre os estudos e a fábrica. "Estou sempre aqui no domingo", diz. (GUILHERME WERNECK)


Texto Anterior: Fique atento
Próximo Texto: Escuta aqui: O som glacial de uma Nova York que já viu tudo
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.