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Comportamento
Casa do barulho
Conheça a rotina dos músicos que deixam seus Estados e se juntam em repúblicas para tentar viver do rock em SP
DANIELA ARRAIS
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
ESTÊVÃO BERTONI
DA REDAÇÃO
Foi só quando uma advertência assinada
pelo síndico chegou
entre as cobranças
de água, luz e internet, que João, Bruno e Léo se
deram conta de que ensaiar em
um dos dois quartos do apartamento em que vivem, no bairro
de Santa Cecília (área central
de SP), era uma furada.
Com o título "Excesso de barulho (banda de rock)" em negrito, a carta dissolvia os planos
dos sergipanos Rockassetes de
"fazer um som" em casa.
Há dois anos, os garotos de
Aracaju decidiram "viver do
rock". Largaram emprego e faculdade e escolheram São Paulo para morar, com a justificativa de que, na cidade, existem
mais lugares para fazer show,
mais mídia para divulgar a banda e mais gente querendo ouvir
o som que eles fazem.
"A idéia [de vir para São Paulo] foi ganhando espaço com o
tempo. Mesmo assim, houve
quem protestasse: éramos um
quarteto e nosso outro guitarrista não viria nem amarrado",
diz Bruno Mattos, 23, vocalista
e guitarrista do grupo.
Vieram como trio: Bruno, o
irmão baterista Léo Mattos, 21,
e o baixista João Melo, 25. Voltaram a ser quarteto com o
amigo baiano Rafael Costelo,
23, que mora na rua de trás.
Sem o conforto da casa dos
pais e tendo que se adaptar a
uma cidade com alto custo de
vida, os músicos optaram por
viver em uma república. Os garotos dividem tarefas domésticas, se desdobram para pagar as
contas com o que arrecadam
em shows e tentam manter vivas as plantas da sala, que, pelo
menos durante a visita do Folhateen ao apartamento, estavam "verdinhas".
Não tão bem regadas estavam as plantas no apartamento
dos acreanos Los Porongas, na
Vila Mariana (zona sul). Na cozinha, pratos acumulados na
pia; nos quartos, roupas jogadas pelos cantos. Mas calma!
João, Anzol, Diogo e Magrão
contam com a ajuda de uma
empregada a cada 15 dias.
Há cinco meses na cidade, a
banda vive em um apartamento de dois quartos emprestado
pelo pai de uma amiga.
A mudança para São Paulo
foi planejada. "Fizemos um cálculo para sobreviver por um
ano. A vinda foi um investimento mesmo", lembra Anzol.
A exemplo dos Rockassetes, a
maioria dos integrantes do Los
Porongas -Diogo Soares, 25,
João Eduardo, 25, Jorge Anzol,
38- largou o emprego. O único
que manteve a profissão foi o
baixista Márcio Magrão, 35.
Bancário, ele conseguiu
transferência para São Paulo.
E, pelo menos com alimentação, a permanência de Magrão
no trabalho tem ajudado na
manutenção da república: com
os tíquetes que ele recebe, a
banda faz a feira do mês.
Para o vocalista Diogo, ficar
longe da família é a questão
mais difícil. "Se dependesse de
cada um, ninguém teria vindo
agora, mas o projeto da banda
falou mais alto, e todo mundo
está dando muita força."
Foi também pelo projeto de
banda que os paraibanos do Zefirina Bomba saíram de João
Pessoa, há três anos. Ilsom Barros, 30, voz e viola, e Gutemberg Almeida, o Guga, 28, bateria, vieram à cidade a convite de
um produtor. "Íamos ficar apenas por dois, três meses. Mas tivemos que alugar uma casa, e o
contrato com o dono era de
dois anos", lembra o ex-professor de educação física Ilsom.
Ficaram. Na casa alugada em
Pinheiros (zona oeste), moram
Ilsom, Guga e a produtora do
grupo. Fecha a formação o baixista Martim Batista, 26.
A adaptação nos seis primeiros meses, diz Ilsom, foi difícil.
"Não conhecíamos ninguém,
era difícil conseguir show." Hoje, o músico é só elogios à cidade: "Aqui é o centro de tudo".
Dividir o mesmo espaço pode
dar em briga. Mas, nas repúblicas, o tempo dá um jeito de colocar tudo no lugar. "Tinha hora que um queria ouvir som alto enquanto o outro não queria.
Hoje está tranqüilo", diz Ilsom.
Para Diogo, do Los Porongas,
"se não tiver maturidade para
se respeitar, não tem como ter
banda".
Mesmo convivendo bem, a
banda pensa em seguir um conselho do baixista Ricardo Koctus, do Pato Fu. "A primeira
coisa que a gente deve fazer
quando estiver estabilizado é
morar separado. Se não a banda acaba", diz Anzol.
Enquanto a "casa própria"
não ganha endereço, os músicos buscam fugir das brigas
com os vizinhos. Os Rockassetes que o digam. Hoje, eles ensaiam apenas em estúdio.
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