São Paulo, segunda-feira, 24 de setembro de 2007

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Comportamento

Casa do barulho

Conheça a rotina dos músicos que deixam seus Estados e se juntam em repúblicas para tentar viver do rock em SP

DANIELA ARRAIS
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

ESTÊVÃO BERTONI
DA REDAÇÃO

Foi só quando uma advertência assinada pelo síndico chegou entre as cobranças de água, luz e internet, que João, Bruno e Léo se deram conta de que ensaiar em um dos dois quartos do apartamento em que vivem, no bairro de Santa Cecília (área central de SP), era uma furada.
Com o título "Excesso de barulho (banda de rock)" em negrito, a carta dissolvia os planos dos sergipanos Rockassetes de "fazer um som" em casa.
Há dois anos, os garotos de Aracaju decidiram "viver do rock". Largaram emprego e faculdade e escolheram São Paulo para morar, com a justificativa de que, na cidade, existem mais lugares para fazer show, mais mídia para divulgar a banda e mais gente querendo ouvir o som que eles fazem.
"A idéia [de vir para São Paulo] foi ganhando espaço com o tempo. Mesmo assim, houve quem protestasse: éramos um quarteto e nosso outro guitarrista não viria nem amarrado", diz Bruno Mattos, 23, vocalista e guitarrista do grupo.
Vieram como trio: Bruno, o irmão baterista Léo Mattos, 21, e o baixista João Melo, 25. Voltaram a ser quarteto com o amigo baiano Rafael Costelo, 23, que mora na rua de trás.
Sem o conforto da casa dos pais e tendo que se adaptar a uma cidade com alto custo de vida, os músicos optaram por viver em uma república. Os garotos dividem tarefas domésticas, se desdobram para pagar as contas com o que arrecadam em shows e tentam manter vivas as plantas da sala, que, pelo menos durante a visita do Folhateen ao apartamento, estavam "verdinhas".
Não tão bem regadas estavam as plantas no apartamento dos acreanos Los Porongas, na Vila Mariana (zona sul). Na cozinha, pratos acumulados na pia; nos quartos, roupas jogadas pelos cantos. Mas calma! João, Anzol, Diogo e Magrão contam com a ajuda de uma empregada a cada 15 dias.
Há cinco meses na cidade, a banda vive em um apartamento de dois quartos emprestado pelo pai de uma amiga.
A mudança para São Paulo foi planejada. "Fizemos um cálculo para sobreviver por um ano. A vinda foi um investimento mesmo", lembra Anzol.
A exemplo dos Rockassetes, a maioria dos integrantes do Los Porongas -Diogo Soares, 25, João Eduardo, 25, Jorge Anzol, 38- largou o emprego. O único que manteve a profissão foi o baixista Márcio Magrão, 35.
Bancário, ele conseguiu transferência para São Paulo. E, pelo menos com alimentação, a permanência de Magrão no trabalho tem ajudado na manutenção da república: com os tíquetes que ele recebe, a banda faz a feira do mês.
Para o vocalista Diogo, ficar longe da família é a questão mais difícil. "Se dependesse de cada um, ninguém teria vindo agora, mas o projeto da banda falou mais alto, e todo mundo está dando muita força."
Foi também pelo projeto de banda que os paraibanos do Zefirina Bomba saíram de João Pessoa, há três anos. Ilsom Barros, 30, voz e viola, e Gutemberg Almeida, o Guga, 28, bateria, vieram à cidade a convite de um produtor. "Íamos ficar apenas por dois, três meses. Mas tivemos que alugar uma casa, e o contrato com o dono era de dois anos", lembra o ex-professor de educação física Ilsom.
Ficaram. Na casa alugada em Pinheiros (zona oeste), moram Ilsom, Guga e a produtora do grupo. Fecha a formação o baixista Martim Batista, 26.
A adaptação nos seis primeiros meses, diz Ilsom, foi difícil. "Não conhecíamos ninguém, era difícil conseguir show." Hoje, o músico é só elogios à cidade: "Aqui é o centro de tudo". Dividir o mesmo espaço pode dar em briga. Mas, nas repúblicas, o tempo dá um jeito de colocar tudo no lugar. "Tinha hora que um queria ouvir som alto enquanto o outro não queria. Hoje está tranqüilo", diz Ilsom.
Para Diogo, do Los Porongas, "se não tiver maturidade para se respeitar, não tem como ter banda".
Mesmo convivendo bem, a banda pensa em seguir um conselho do baixista Ricardo Koctus, do Pato Fu. "A primeira coisa que a gente deve fazer quando estiver estabilizado é morar separado. Se não a banda acaba", diz Anzol.
Enquanto a "casa própria" não ganha endereço, os músicos buscam fugir das brigas com os vizinhos. Os Rockassetes que o digam. Hoje, eles ensaiam apenas em estúdio.

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