São Paulo, segunda-feira, 25 de junho de 2007

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literatura

Rota da liberdade

"On the Road", considerado a "bíblia dos mochileiros", completa 50 anos e continua fazendo a cabeça de jovens

Associated Press
O escritor Jack Kerouac


CARLOS MINUANO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Sair e viver ou ficar e apodrecer?
O escritor americano Jack Kerouac (1922-1969) escolheu a primeira opção e lançou-se em uma série de viagens que mudou não apenas a própria vida mas a de várias gerações.
Cansado da mesmice, cruzou os EUA de carona em carros, ônibus e vagões de trem. Logo depois, deu vida à obra-prima que abriu caminho para uma nova literatura e a outras formas de pensar o mundo.
"On the Road", clássico que fala sobre estradas e liberdade, completa agora 50 anos e continua fazendo a cabeça de jovens sintonizados com o espírito libertário do autor.
Para o estudante Pedro Ivo, 16, a magia anárquica de Jack Kerouac foi mais forte que a de Harry Potter.
Depois que devorou "On the Road" em três dias, as aventuras do aprendiz de mago não saíram mais da gaveta. O livro de Kerouac foi indicado por um amigo, mas Pedro conta que a identificação foi instantânea.

Ânsia por liberdade
"A impulsividade dos personagens foi o que mais me atraiu, a ânsia deles por liberdade, e o melhor é que tudo veio de uma experiência real, no fundo não é ficção", conta o estudante.
Pedro não parou por aí. Ele buscou outros autores do movimento beatnik, como Allen Ginsberg e Neal Cassady, além de ícones da literatura marginal como o beberrão Charles Bukowski.
A paixão de Ivo por esses livros acabou influenciando a amiga, também estudante, Valéria Esther, 18.
Para ela, o guru das estradas deixou verdadeiras lições de vida: "Ele me ensinou um bocado sobre desapego, que não precisamos de muito para ser feliz, que ter amigos de verdade é mais importante".
A estudante conta que vai esperar o amigo completar 18 anos para irem juntos para a estrada, acampar, subir montanhas e, assim como os velhos beatniks, desbravar novos horizontes.

"Loucos para viver"
Em busca da sonoridade das estradas, Kerouac andou entre vagabundos, intelectuais e figuras comuns, as pessoas que realmente lhe interessavam.
Segundo ele, essas pessoas eram "os loucos para viver, falar, serem salvos, que querem tudo ao mesmo tempo, nunca bocejam e jamais dizem coisas comuns".
"On the Road", ou "Pé na Estrada", na tradução brasileira, foi um soco no estômago da literatura americana da época, moralista e obtusa. A força subversiva da obra se faz notar nas influências que projetou ao longo de décadas.
Reza a lenda que Bob Dylan botou o pé na estrada depois de ler e que Jim Morrinson criou os "Doors". E as vidas de Neil Young, Bono e do ator Johnny Depp, entre outros, não seriam as mesmas sem o livro.
Para o cineasta Walter Salles, que prepara filme inspirado no clássico beat, sem Kerouac e sua turma, avanços da década de 60 como a revolução sexual, a expansão da mente através das drogas, a busca por religiões alternativas e as primeiras preocupações ecológicas não seriam possíveis. "A geração beatnik foi um grito de liberdade contra uma forma binária de pensar o mundo: o certo e o errado, o bom e o mal".

Mudanças na vida
Dezenas de comunidades no Orkut, centenas de sites na internet e milhares de cabeças navegando na onda do pai dos beats. Na vasta tribo de seguidores virtuais, uma questão aparece: as mudanças que o livro provocou na vida do leitor.
Mito ou verdade, histórias não faltam. Saulo de Andrade, 23, leu a bíblia hippie aos 15, após descobrir que o ídolo Jim Morrinson havia bebido na mesma fonte. Depois, sua vida não foi mais a mesma.
Saulo conta que, de repente, o velho mundo em sua volta já não parecia o mesmo. "Comecei a questionar tudo e percebi que nem sempre o que a sociedade nos impõe como verdadeiro é real, e vice-versa".
Alguns anos depois, sua vida ainda lembra o universo beat. Apesar de estudar administração, mergulhou de cabeça nas artes, toca 12 instrumentos -da cítara indiana a kalimba africana- e se diverte sempre que possível com suas pinturas psicodélicas inspiradas pela atmosfera beatnik.
Para Saulo, a mensagem de Kerouac é bem clara: "Seja você mesmo!".


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