São Paulo, segunda-feira, 26 de outubro de 2009

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A escola do meu jeito

Entre muitos eventos e pouca contestação, grêmios se propõem a dar voz aos alunos

Fotos Letícia Moreira/ Folha Imagem
Miguel, Luca, Vitor, Ana Carolina e Ana Paula no pátio do Arquidiocesano

DIOGO BERCITO
DA REPORTAGEM LOCAL

No Colégio Santa Cruz, na zona oeste de São Paulo, o álbum do Campeonato Brasileiro de futebol não é a vedete dos intervalos.
Em vez de trocar figurinhas dos craques de clubes nacionais, os estudantes colecionam fotos adesivas com rostos dos colegas nos times da escola.
O álbum da competição interna do colégio foi feito pelo grêmio e é vendido por R$ 10. Os pacotes com cinco figurinhas custam R$ 0,50 cada um.
Mas, quando o Folhateen procurou os alunos do grêmio para conversar sobre o assunto, eles relutaram em falar. "Não queremos que pareça que o grêmio é só isso", diz o aluno Caio Martins Ferreira, 15.
Fica então a pergunta. O que é o grêmio, então?
Por definição, é uma instituição estudantil montada a partir de um grupo de alunos interessados em promover mudanças em sua escola.
No Santa Cruz, a chapa eleita pelos estudantes para a gestão atual foi a Chapa Livre, que competiu com grupos de brincadeirinha -como a Sacrochapa Romano-Germânica, que defendia o retorno do império medieval de nome parecido.

Fazer barulho
Entre os colégios ouvidos pela Folha, predomina o modelo do Santa Cruz, com atuação focada em promoção de eventos.
No Colégio Santa Maria, na zona sul, o grêmio fez concurso fotográfico e uma semana de arte, entre outras atividades.
Mas há, também, espaço para contestações e reivindicações, dentro e fora da escola?
Durante a ditadura militar, os grêmios tiveram esse papel. Alfredo Sirkis, exilado na época, começou sua trajetória política participando do Grêmio Livre do Colégio de Aplicação da UFRJ.
Dali, foi para o movimento armado de resistência ao governo militar e às marchas em prol do impeachment de Fernando Collor. Hoje é vereador pelo Partido Verde, no Rio.
Mesmo a ausência de reivindicações não significa ausência de descontentamento. "Pensamos em pedir para diminuir os preços da cantina, mas não fomos atrás disso porque a gestão anterior do grêmio tentou e não deu certo", explica Cláudio Santos, 16, diretor de arte do grêmio do Santa Maria.
Já no Colégio Visconde de Porto Seguro, na zona oeste, os alunos tentaram mudar o estilo do uniforme obrigatório. "Nossa reclamação foi em relação ao visual", diz Gabriel Vilela, 16, presidente do grêmio do colégio. "Fizemos campanha, pesquisa de opinião e passamos para a diretoria, que disse que avaliará as sugestões."
Há também as escolas que proíbem o funcionamento de grêmios estudantis, o que contraria uma lei de 1985 -que também garante eleições diretas. É o caso do Colégio Agostiniano Mendel (zona leste).
"Um grêmio cria conflitos, quando os alunos querem alguma coisa que não podemos dar", diz o padre Felix Conde de Prado, diretor da escola.
Colégios particulares como Miguel de Cervantes, Sion e Pueri Domus também não têm grêmios em funcionamento, apesar de, segundo as escolas, não haver proibição.

Altas somas
Arrecadar dinheiro para os projetos, muitas vezes, é um suplício. Em algumas escolas, porém, os alunos aceitam também financiamento da direção. É o caso do Colégio Marista Arquidiocesano, na zona sul.
Um show de bandas de alunos, por exemplo, recebeu R$ 6.000. A copa jogada durante o recreio teve orçamento de R$ 2.000. "É como uma empresa", explica Vitor Pereira, 15.
Ter apoio ajuda nos grandes projetos. Depender muito da direção, porém, pode dificultar a mobilização dos alunos.
"É uma falsa democracia, quando só deixam o aluno interferir em coisas pequenas, como na decoração da festa", diz Mônica Zagallo, coordenadora da área de juventude da organização Sou da Paz -que fomenta o surgimento de grêmios como maneira de diminuir a violência nas escolas.
Mas Arthur Herculano, 22, presidente da União Paulista de Estudantes Secundaristas, completa. "O grêmio não é só uma questão de luta, e sim de cultura, e isso também faz parte da formação do aluno."
E as reivindicações não são apenas políticas. Prelo Zandonadi, ex-vice-diretor do grêmio do Colégio Humboldt, na zona sul, reclama não ter conseguido montar uma rádio estudantil e nem instalar relógios nas salas de aula. "Tínhamos um professor orientador, e essa ideia vai contra o princípio do grêmio."
Segundo a escola, o professor participa "para ajudar", a instalação dos relógios acaba de ser aprovada e a criação de uma rádio está em estudo.

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