|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
ESTANTE
A cor do mundo quando visto bem perto do abismo
Imagine um cego e um outro cara,
ambos dentro de um lugar quase
totalmente fechado, o cego perguntando de que cor está o mundo. E o
sujeito responde: "Cinzento". Em
seguida, ele se corrige, modificando
o nome da cor do mundo: "Preto
claro". Um mundo preto claro, medonho, com uma cor que não existe.
Esse é apenas um pedaço de diálogo de uma das peças mais atordoantes já escritas: "Fim de Partida", do
sensacional escritor irlandês Samuel Beckett (1906-1989).
Apesar de ter levado uma vida
pessoal bastante regular, Beckett
desenvolveu uma literatura em que
o horror do mundo está todo concentrado na paisagem e, mais ainda,
nas relações entre os indivíduos.
Em "Fim de Partida", aparecem
dois sujeitos, Hamm e Clov. Dão a
entender que não se suportam, mas
não conseguem sair um de perto do
outro. O elenco se completa com a
presença de um casal de velhos. Nenhum deles tem ilusão quanto ao
futuro do mundo -e nisso, segundo se comenta, Beckett alude ao
mundo do pós-Guerra.
A peça é interessantíssima, mas
requer um pouco de estômago, porque os quatro seres se apresentam
em toda a sua decadência e mesquinhez, como se representassem a nós
todos de modo concentrada, registrando as baixezas que nos fazem
humanos e que são pavorosas
quando vistas de perto: autoritarismo, falta de solidariedade, compaixão interesseira, solidão, falta de esperança. Fim de partida mesmo.
"Fim de Partida"
Autor: Samuel Beckett
Tradução: Fábio de Souza Andrade
Editora: Cosac & Naify
Quanto: R$ 39
Texto Anterior: Folhateen explica: Taxa de mortalidade infantil cai menos na última década Próximo Texto: Eu leio Índice
|