São Paulo, segunda-feira, 29 de setembro de 2008

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retrô

Devoradores de bolachas

Discos de vinil caem no gosto do jovem e passam a ser cultuados como relíquias; nos EUA e até mesmo aqui no Brasil, procura por LPs cresceu

Patricia Stavis/Folha Imagem
Fred gosta de ficar viajando nas capas e nos encartes de seus mais de 300 discos pretos

LETICIA DE CASTRO
DA REPORTAGEM LOCAL

Toda semana, a estudante Camila Ciampi, 15, tem um encontro marcado com a amiga Camila Leme em uma praça perto da sua casa. Elas levam uma vitrola portátil e uns dez LPs cada uma para ouvir ao ar livre, enquanto conversam sobre discos, bandas e vida em geral.
Se o hábito de Camila parece estranho em plena era do MP3, do iPod e dos downloads, é bom esclarecer: assim como ela, muitos adolescentes estão descobrindo o charme das bolachas. Apesar de ter tido sua "morte" decretada há 20 anos, o disco de vinil está ganhando novo fôlego e virou objeto de desejo entre o público jovem. "A maioria dos meus amigos têm vitrola e compra LPs", afirma.
A modinha é comprovada por dados da associação da indústria fonográfica americana (Recording Industry Association of America, RIAA). De acordo com o mais recente levantamento da entidade, a venda de LPs cresceu 36,6% de 2006 a 2007. Já a de CDs despencou 17,5%.
No Brasil, onde a última fábrica que produzia discos fechou no início do ano, não há dados sobre vendas, mas lojistas observam o aumento do interesse entre o público jovem.
"Quando começamos a vender, o público era de colecionadores mais velhos. Hoje há cada vez mais jovens", observa Fabio Herz, diretor comercial da Livraria Cultura, que, desde o final de 2006, importa LPs (leia mais na página 8).
O estudante Fred Mauro, 21, é um desses jovens colecionadores. Ele tem mais de 300 discos, adquiridos em feiras, sebos, com a família (ele herdou os LPs do pai) e até na internet.
Para ele, CD é coisa do passado, enquanto o vinil voltou para ficar. "O CD está acabando, é uma mídia muito descartável e frágil. Você esquece em qualquer lugar, ele risca. Já o vinil, exige mais cuidado, você acaba criando uma relação de carinho", diz o estudante, que só compra em CD o que não consegue achar em vinil.
Mesmo colecionando LPs, Fred não dispensa o download. Mas quando ele realmente gosta de uma banda que ouviu na internet, procura o disco em vinil. Quando quer comprar algum lançamento, apela para sites como e-bay e gemm.com, já que as gravadoras não lançam novidades por aqui.
Desde que passou a cultuar as bolachas, Fred mudou sua maneira de ouvir música. "Antes eu fazia playlist no computador. Agora escolho o disco, coloco na vitrola e fico viajando na capa e no encarte", conta o garoto, que começou a colecionar há cerca de cinco anos.
A estrela teen Mallu Magalhães, 16, também não abre mão das relíquias de família. Ela começou garimpando discos nas casas dos avós e hoje tem sua própria coleção. "Tem certos tipos de música que combinam com vinil. Beatles, por exemplo, eu só gosto de ouvir na vitrola", diz.

Superior ao CD
Para quem tem uma boa vitrola e bons amplificadores, a qualidade do som do vinil é considerada superior à do CD. Mas não é só isso que atrai: as capas, o encarte, o prazer de garimpar um raridade e a dedicação que a manutenção dos discos exige são outros motivos que fazem os jovens se renderem ao charme da bolacha.
"A gente cria uma relação de carinho", diz a estudante Glaucia Oliveira, 22, amiga de Fred.
Para Marcelo Lima, 23, até a necessidade de trocar o lado de disco tem seu charme. "Cada lado tem uma cara. É uma obra completa, pensada", comenta.
Para ele, a modinha já começa a ter seus inconvenientes. "Tem mais gente procurando, então os preços aumentaram ", observa o estudante, que tem cerca de 800 discos, a maioria de jazz e de música brasileira.


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