São Paulo, quinta-feira, 13 de maio de 2004
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QUÍMICA

Brasileiro também sabe enriquecer urânio

LUÍS FERNANDO PEREIRA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Há poucas semanas, o Brasil se envolveu em um tremendo imbróglio com as Nações Unidas. Tudo porque o governo não quis autorizar que técnicos da Agência Internacional de Energia Atômica inspecionassem nossas instalações nucleares. Objetivo: investigar nossas aparelhagens de enriquecimento de urânio.
Não há muito urânio (U) na natureza, apenas alguns minérios como a pechblenda, um óxido desse metal. Neles, o urânio aparece principalmente na forma de dois isótopos (átomos com o mesmo número de prótons): U-238 (99,3% do total) e U-235 (só 0,7%).
Acontece que só o U-235 pode ser utilizado para gerar energia (235 é o seu número de massa). O U-238, não. Percebeu o problema? O "urânio bom" é o mais raro. E põe raro nisso! O que os cientistas fazem é dar um jeito de aumentar a proporção do U-235 na mistura, isto é, enriquecer o urânio. E olha que não é nada fácil. Até hoje, só uns dez países conseguiram.
Para enriquecer o urânio, deve-se combiná-lo com o flúor para formar o gás hexaflureto de urânio (UF6). A partir daí, há duas opções principais: difusão gasosa ou ultracentrifugação. A primeira consiste em "empurrar" as moléculas de UF6 contra uma barreira porosa. As moléculas que contêm U-235, mais leves, deslocam-se mais rapidamente através dessa barreira, e os isótopos são separados. A segunda (opção brasileira) utiliza uma ultracentrífuga que gira com o gás UF6 lá dentro. Ela faz o mesmo que qualquer outra centrífuga: separa os materiais mais pesados (U-238), jogando-os contra a parede do aparelho, dos mais leves (U-235), que ficam concentrados no centro.
Com o urânio enriquecido a cerca de 3%, pode-se alimentar uma usina e, a 20%, um submarino nuclear. Isso é possível graças à fissão que o núcleo do U-235 pode sofrer (mas o U-238, não). A fissão é a quebra do núcleo do urânio bombardeado por um nêutron (0n1). Veja: 92U235 + 0n1 36Kr93 + 56Ba140 + 3 0n1.
Nesse processo de quebra do núcleo, há perda de massa, que se converte em energia, como já previa Einstein em sua célebre fórmula: E (energia) = m (massa).c2 (velocidade da luz ao quadrado). E olha que não é pouca coisa, já que, energeticamente, 1 g de U-235 corresponde a 2,5 milhões de litros de gasolina!!
Sabe o que é possível construir com o urânio enriquecido a cerca de 95%? Uma bomba atômica! Entendeu agora o motivo de estarem de olho na gente?


Luís Fernando Pereira é professor do curso Intergraus e coordenador de química do sistema Uno/Moderna. E-mail: lula7@terra.com.br


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