São Paulo, terça-feira, 23 de fevereiro de 2010
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GEOGRAFIA

Indígenas na pista


Os órgãos do governo diferenciam os indígenas dos demais residentes ou "pedestres" da região


ARNO A. GOETTEMS
ESPECIAL PARA A FOLHA

Esse é um dos avisos ao motorista que trafega pela RS-406, uma das rodovias que ligam o norte do Rio Grande do Sul a Santa Catarina.
A placa, fotografada no município de Nonoai (RS), suscita algumas reflexões a respeito da questão indígena no Brasil e na América Latina.
Ao usar o termo "indígenas", e não "pedestres", percebe-se que os órgãos governamentais responsáveis pelo tráfego local diferenciam esse grupo social dos demais residentes ou "pedestres" da região.
E é nessa diferenciação que está a raiz da situação de exclusão social em que se encontram diversos povos indígenas latino-americanos.
Inicialmente perseguidos e escravizados, ainda que houvesse forte resistência por parte de diversas tribos, eles vivem atualmente em reservas, modelo adotado no Brasil desde a década de 1960, seguindo a política adotada nos Estados Unidos. Na maior parte da América Latina, porém, não foram criadas áreas específicas para os povos que viviam nessas terras antes da chegada dos colonizadores europeus.
Grande parte dos descendentes dos outrora poderosos impérios inca, maia e asteca se encontram em situação de extrema pobreza.
Entretanto, nota-se algo em comum na política indigenista brasileira e na dos demais países dessa região: a questão indígena está cada vez mais vinculada à questão agrária.
Coincidentemente ou não, Nonoai se encontra na mesma região do município de Sarandi (PR), um dos berços do MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), fundado na década de 1980.
No Chile, a reforma agrária teve início na década de 1970, na região de Temuco, no sul, em decorrência das reivindicações e invasões de propriedades promovidas pelos camponeses indígenas mapuches.
Não há dúvida de que alguns dos métodos adotados pelos movimentos que lutam pela reforma agrária são discutíveis e mesmo inaceitáveis.
Por outro lado, é inquestionável que a concentração fundiária é uma triste realidade em todo o continente.
Para os povos indígenas brasileiros, resta a esperança de manter e desenvolver suas culturas nas áreas a eles destinadas por lei -ainda que grupos que defendem os interesses de proprietários de terras, como o MNP (Movimento Nacional de Produtores), considerem os índios verdadeiros latifundiários, já que cada um seria "dono" de 2.460 hectares e que, no total, essa população detém 12% do território nacional.
Trata-se, portanto, de um embate de grandes proporções e que ainda está por ser resolvido no Brasil e na maior parte dos países vizinhos.
Vez por outra, essa questão vem à tona. Alguns exemplos são os recentes casos dos conflitos ocorridos em Roraima, com a criação da Reserva Indígena Raposa Serra do Sol, ou da revolta dos índios peruanos da região amazônica diante do interesse do governo em "regulamentar" a exploração dos recursos minerais naquela região, entre muitos outros.
Em outros períodos, paira nos meios de comunicação uma aparente tranquilidade sobre o tema, perturbada por uma placa de beira de estrada desse imenso e mal distribuído território brasileiro.


ARNO GOETTEMS é professor de geografia do colégio Santo Américo.

arno@csasp.g12.br




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