|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CONTRA
Problema de escolarização surge no ensino básico
EUNICE R. DURHAM
ESPECIAL PARA A FOLHA
Lamento que, no Brasil, tenhamos nos encaminhado no sentido de imitar os Estados Unidos na questão das cotas "raciais",
quando eles já reconheceram os
resultados discutíveis dessas iniciativas, as quais, além do mais,
não levam em consideração as diferenças entre a realidade americana e a brasileira.
O Brasil sempre teve o bom senso de evitar o destrutivo caminho
seguido pelos Estados Unidos e
pela África do Sul, que consistiu
em oficializar uma rígida separação preexistente entre brancos e
pretos, forçando que cada um optasse por uma ou outra condição:
quem não é branco é negro. Entre
nós, há de fato muito poucos negros e poucos brancos puros. A
imensa maioria da população é
mestiça, e o nosso caminho para
enfrentar a discriminação consiste em reconhecer essa realidade e
valorizar a mestiçagem.
Filhos de brancos e negros não
são nem brancos nem negros, e
mulatos abrangem uma população muito diferenciada em termos de presença de traços negróides. Como estabelecer o critério
de classificação? Um mulato claro
que se classificou como negro para entrar na faculdade terá de
manter essa classificação quando
procurar um emprego ou se casar? E os filhos de uma mesma
mãe, alguns dos quais são muito
claros e outros mais escuros serão
separados em termos de raça?
Não há discriminação por cor
nos exames vestibulares das escolas públicas. O pequeno número
de negros que ingressa nas universidades se deve a um problema
anterior de escolarização. Precisamos atacar o problema no nível
no qual ele é criado, que é no ensino público básico.
Cabem sem dúvida ações afirmativas de compensação de discriminações anteriores. A sociedade civil brasileira já havia encontrado uma solução mais condizente com a nossa cultura: os
cursos de suplementação escolar
para vítimas de discriminação, de
forma a que elas pudessem competir no vestibular em igualdade
de condição com os demais estudantes e não só entrar na universidade mas ser bem-sucedidas nos
estudos. O que faz sentido é ampliar iniciativas governamentais
ou das próprias universidades
nessa direção, assim como apoiar
financeira e pedagogicamente
ONGs que realizam essa tarefa.
Eunice R. Durham é pesquisadora sênior do Nupes (Núcleo de Pesquisa sobre
Ensino Superior da USP). Foi membro do Conselho Nacional de Educação (1997-2001).
Texto Anterior: A favor: Cotas para promover a igualdade Próximo Texto: Em dia: Já passei por isso Índice
|