São Paulo, sexta-feira, 01 de março de 2002

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CINEMA/ESTRÉIA

Premiado com a Palma de Ouro de melhor direção, "O Homem que Não Estava Lá" chega agora ao Brasil

O pequeno mundo dos irmãos Coen

TETÉ RIBEIRO
FREE-LANCE PARA A FOLHA, EM CANNES

Chegou de novo uma das melhores notícias do cinema: tem filme novo dos irmãos Coen estreando no Brasil. Desta vez é "O Homem que Não Estava Lá", que os EUA viram no fim de 2001 e o Festival de Cannes, há quase um ano -e de onde Joel, 47, e Ethan, 44, voltaram com a Palma de Ouro de melhor direção.
A dupla é a mais original em atividade cinematográfica hoje em dia. Seus filmes são diferentes uns dos outros, e não dão a menor pista do que os dois podem fazer em seguida. Foi assim com o thriller "Fargo", com o semimusical "E Aí, Meu Irmão, Cadê Você?", com a comédia "O Grande Lebowski".
É assim de novo com esta homenagem ao filme noir, em preto e branco e tão cheia de climas que fez Billy Bob Thornton, ator principal e narrador do filme, virar galã. Os dois diretores falaram com a imprensa estrangeira em Cannes. Leia trechos abaixo.

Folha - Como vocês dividem as funções no set e como se sentem com os cargos que ocupam? Por que Joel é sempre o diretor, e Ethan, o produtor?
Ethan Coen -
Por mim está tudo bem do jeito que está...

Joel - Acho que nenhum de nós se importa de verdade com isso. A descrição do trabalho de cada um ou o nome da função que cada um ocupa não é das maiores preocupações que temos. Vemos nosso trabalho como uma colaboração, tanto entre nós como entre muitas outras pessoas com quem trabalhamos.
Frequentemente trabalhamos com as mesmas pessoas em muitos filmes, é um esquema em que contamos com a criatividade do conjunto e com o que elas podem trazer. É uma grande colaboração entre amigos. O trabalho é tão intenso que é difícil levar qualquer nomenclatura muito a sério.

Folha - O título de trabalho do filme foi "O Filme do Barbeiro" e "O Projeto do Barbeiro". Porque se decidiram por "O Homem que Não Estava Lá"?
Ethan -
As duas opções que você falou não eram exatamente títulos, mas nomes pelos quais nos referíamos ao filme, que ainda não tinha título. Não sei.

Folha - Vocês são famosos por escolherem bem e com cuidado as músicas para a trilha de seus filmes. Gostaria que comentassem as escolhas feitas para este filme, especialmente as sonatas de Beethoven.
Joel -
As sonatas foram sugeridas inicialmente por causa da trama, o personagem estava estudando piano, mas depois achamos que o fundo de Beethoven combinava. Como sempre, fizemos muitas opções e escolhemos o que parecia certo, o que nos fazia sentir que estava bem. Não há nenhuma razão intelectual. A maior razão era o Billy Bob Thornton. Tinha de combinar com o personagem dele.

Folha - Vocês ainda se consideram "independentes"?
Joel -
Esses rótulos são difíceis de se decifrar quando aplicados a você mesmo. Você nunca sabe direito o que eles significam, ou que tipo de comentário está por trás deles. Cinema independente não tem uma definição exata, ninguém sabe o que isso significa de verdade. Mas o que quer que seja que você sinta a respeito disso em pouco muda completamente.
Quando começamos, havia muitos filmes sendo feitos fora dos grandes estúdios e tendiam a ser filmes de gênero ou de exploração. Hoje em dia esses filmes viraram um elemento da indústria do cinema como outro qualquer. É só olhar para o que aconteceu com o Sundance nos últimos 15 anos. De certa forma, isso também dificulta que se fale em rótulos com tanta propriedade.

Ethan - Todo o mundo sabe o que é um filme feito por um grande estúdio de Hollywood. Fora isso, e no nosso caso principalmente, não sabemos onde nos colocar. Já fizemos filmes que foram financiados por fora do esquema dos estúdios. Também fizemos filmes financiados por grandes estúdios. Fizemos filmes financiados por dinheiro de fora dos EUA, mas distribuído por um esquema de Hollywood. Então não sei onde nos colocar nessa história, mas acho que isso não importa tanto. Acho que o cinema acomoda pontos de vista diferentes.
Gosto de pensar que somos cineastas de meia-idade que colocam muito risco nas obras que fazem. A inovação hoje em dia acontece muito mais nos filmes digitais. As novas gerações estão em busca de um jeito mais barato de fazer filmes, que não precisam de tanto dinheiro, portanto não têm de responder a tanta gente. Esse é o coração do filme independente, é o que queríamos quando começamos no cinema.



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