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CINEMA
Documentário registra o cotidiano de trabalho e as aspirações de sucesso de três moradores da periferia carioca
"Fala Tu" pretende dar voz aos rappers
DA REPORTAGEM LOCAL
Uma cadeira de plástico na calçada e uma cestinha de papéis dependurada no poste compõem o
"escritório" de Alexandre Magalhães, 35, o Macarrão.
Para não incomodar os clientes
nem atrapalhar o movimento, o
cineasta Guilherme Coelho, 24,
tomou o cuidado de instalar sua
câmera no outro lado da rua todas as vezes em que registrou Macarrão trabalhando. Ele é apontador do jogo do bicho, e as imagens de sua rotina no batente estão no documentário "Fala Tu",
que estréia amanhã.
"Já estive mais de 20 vezes na
frente do juiz e disse a ele que não
me envergonho de ser contraventor. Prefiro ganhar R$ 900 no bicho do que R$ 200 como empregado de uma padaria. Tenho três
filhos para criar", diz Macarrão à
Folha, explicando sua sem-cerimônia de ser filmado na contravenção.
Mais do que o trabalho que garante a sobrevivência de Macarrão e sua família, "Fala Tu" se interessa em desvendar a atração do
bicheiro pelo rap e suas tentativas
de conquistar um lugar definitivo
no movimento hip hop. Não apenas as dele. O vendedor ambulante Sérgio Teixeira Filho, 32, o Thogun, e a operadora de telemarketing Combatente, 21, completam
a trinca de personagens do documentário, que compartilham o
cotidiano de habitantes da periferia carioca e o gosto pelo rap.
Combatente é algumas vezes
chamada no filme por seu nome
de batismo, Mônica. Na conversa
com a Folha, ela não quis revelar
seu sobrenome. "Quero trabalhar
agora só meu nome artístico", diz.
Depois de contar no documentário diversas passagens de sua vida, inclusive as mais sofridas,
Thogun estranha que alguém
possa se referir a ele como um
personagem do filme.
"Fala Tu" me deu a oportunidade de mostrar para as pessoas do
que sou feito e fazê-las aprender
um pouco do que eu aprendo todo dia. O meu sofrimento me fez
colocar à prova toda a minha formação", afirma.
Fazer uma "crônica carioca" e
entender como o rap traduz em
arte uma condição adversa era o
ímpeto inicial do diretor Coelho e
de seu co-roteirista Nathaniel Lecrery. Coelho afirma que, no convívio com rappers, se estabeleceu
"uma relação muito próxima".
"Eles toparam participar do filme
porque têm algo a comunicar.
Creio que usaram "Fala Tu" mais
para passar uma mensagem do
que para adiantar a vida profissional. Estava claro que o filme não ia
mudar a vida deles."
Se o filme em si não é capaz de
transformar a vida de seus personagens reais, alguns contatos estabelecidos a partir dele têm aberto portas para Macarrão.
Atualmente, ele participa de
uma equipe de roteiristas selecionados pela agência de produção
norte-americana Picante Pictures, para produzir sinopses de
"sitcoms" que tenham a realidade
da periferia brasileira como pano
de fundo. Macarrão diz que a atriz
e diretora de seriados de TV
Debby Allen ("Fame", "The Twilight Zone") está na coordenação
do projeto. "Tive uma chance em
1 milhão. Vou agarrar essa treta."
Thogun, que está desempregado e trancou a matrícula na faculdade de jornalismo, conta que ouviu do coordenador do curso de
comunicação da PUC-RJ a notícia
de que poderá ganhar uma bolsa.
Combatente diz que se inscreveu
para o programa "Fama", da TV
Globo, porque considera "as aulas
muito boas".
(SILVANA ARANTES)
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