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Com "Antics", Interpol extrapola os limites da cena musical de Nova York
A arte da FUGA
KEVIN HARLEY
DO "INDEPENDENT"
O Interpol não poderia estar
mais composto, hoje. E isso não é
apenas porque chegaram à entrevista usando os devidos ternos e
botas, como se caíssem da cama e
já estivessem prontos para a passarela. A banda lança seu segundo
álbum, "Antics", e tem bons motivos para se sentir confiante. Os
últimos dois anos viram seu álbum de estréia, "Turn on the
Bright Lights", ganhar popularidade: o REM gravou uma de suas
canções ("NYC"), e Robert Smith,
do Cure, os convidou para tocar
no festival Curiosa, nos EUA.
Como é comum no caso de segundos álbuns, "Antics" é um teste sobre como a banda reage ao
sucesso do disco de estréia. Para
resumir, o melhor é não reagir:
"Antics" é um disco repleto de viradas ambiciosas e complexas,
baseadas em um enérgico pós-punk, com resultado superior.
Os integrantes concordam que
o trabalho fluiu de maneira suave.
"Não creio que tenha havido
qualquer preocupação quanto a
descobrir uma maneira de nos superarmos", diz Paul Banks.
O contraste entre os integrantes
é evidente -da aparência confiante, de ídolo das matinês, do
guitarrista Daniel Kessler à ousadia e elegância à maneira Weimar
do baixista Carlos D., passando
pela afabilidade bem-vestida do
baterista Sam Fogarino e pela intensidade oscilante de Banks. Isso
os torna o epítome de uma banda
auto-suficiente.
Kessler e Carlos D. formaram o
Interpol na Universidade de Nova
York em 1998, quando o guitarrista expressou admiração pelas botas que o baixista estava calçando.
Uma cena que se repetiu muitas
vezes. Tanto a banda quanto as
botas começaram a atrair mais a
atenção em 2001, quando o sucesso do grupo Strokes fez com que a
imprensa passasse a apontar NY
como epicentro do que havia de
melhor no rock. O Interpol não
soa nada parecido com a banda
de Julian Casablancas e companhia, mas, muitas vezes, termina
incluído no mesmo pacote, como
se fossem os irmãos mais velhos,
sérios e inteligentes dos líderes da
nova cena musical da cidade.
"Antics" coloca a banda em posição para se tornar o grupo mais
famoso da cidade. Não é uma conexão que a banda desdenhe, mas
sabem que já transcenderam a
condição de uma simples moda.
"As pessoas me perguntavam se
integrar a cena de NY me incomodava, e eu dizia que não, porque a
cidade é ótima e há muitas bandas
excelentes por lá. Nós ficamos felizes porque somos mencionados
na companhia deles", diz Banks.
"Não sei se podemos nos considerar parte do movimento, agora,
porque nunca estamos lá", acrescenta Fogarino. "A tal cena de NY,
para mim, é algo que acontece antes que uma banda faça sucesso e
saia em turnê pelo mundo. É como se tivéssemos nos diplomado.
Não somos mais locais."
Em termos de localização da
banda, os críticos optam por uma
determinada era, como uma espécie de recuo às bandas nervosas
do pós-punk, no começo dos
anos 80, que pareciam ser reação
à ansiedade daquele tempo (Thatcher, Reagan etc.), e também como reação a roqueiros inconseqüentes. "Talvez se deva à nossa
capacidade de pegar no nervo.
Nosso interesse em criar uma atmosfera talvez atraia as pessoas
que precisam disso em um certo
momento", diz Fogarino.
O Interpol prefere não comentar sobre sua suposta capacidade
de capturar o timbre de nossa era.
"Boa parte de nosso primeiro disco foi composto nos anos dourados de Clinton", afirma Banks.
"Não estamos escrevendo em resposta ao fato de que as coisas estão degringolando. Talvez isso seja uma coincidência divertida.
Talvez os artistas sejam estranhamente prescientes."
"Nos anos 80", diz Fogarino, "a
situação envolvia não só as bandas inglesas politizadas, mas o
punk da Califórnia, uma resposta
aos anos Reagan. As coisas acontecem por um motivo. O que
transcorre socialmente alimenta
o que acontece artisticamente".
"Mas não somos uma banda
política", diz Banks. "Temos opiniões relacionadas ao ambiente
político, mas o Interpol não é um
veículo para expressá-las. Para
mim, a idéia é mais escapar disso.
Escapar ao inescapável."
O que vem se provando inescapável para o Interpol é a bateria de
comparações com o Joy Division,
banda símbolo do pós-punk, baseadas na voz de Banks, que lembra Ian Curtis. "Antics", um disco
multifacetado, talvez ponha fim a
essa conversa, da mesma maneira
que os remove de NY. "Sermos
comparados incansavelmente a
algo é incômodo quando você está tentando estabelecer uma identidade", diz Fogarino. "A principal fonte de influência para nós é
interna: o que acontece em nossa
vida, com a banda etc. É essa nossa fonte, não o Joy Division." Ele
suspira. "E se eles pelo menos sacassem, perceberiam que imitamos o Queen. Não sei como as
pessoas não percebem!"
E em termos de letra? "Creio
que haja mais cores na palheta de
coisas desagradáveis que incluo,
melódica e tematicamente", diz
Banks. "Mas isso, com sorte, é
porque tenho uma visão de mundo um pouco mais sofisticada,
porque estou um pouquinho
mais velho. Não é que o disco seja
necessariamente mais caloroso,
mas há mais coisas nele."
Carlos D. provavelmente se sente mais confortável com o que a
descrição "austero" implica do
que com otimismo cru. "Preferiria ser chamado de austero", diz
ele, "a ser visto como demasiadamente ornamentado. Não pretendo dizer que somos austeros, mas
ela possibilita sutileza, nuance,
discrição, coisas que creio importantes para a arte. Você não quer
ser exagerado demais. A simplicidade sempre funciona bem".
Tradução Paulo Migliacci
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