São Paulo, sexta-feira, 01 de abril de 2005

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"EVERYTHING'S OK"

Al Green abençoa a alcova dos justos

MÁRVIO DOS ANJOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Al Green deve ser canonizado, mesmo que sua religião não lhe permita. Papa do soul nos anos 70, o pastor protestante prova que sua definitiva volta ao showbiz, iniciada em 2003 com "I Can't Stop", é para ficar. E aleluia, irmãos!, ele segue convidando à carne no novo "Everything's OK".
A obra do reverendo Al Green (como ele se chama neste CD) sempre foi um poço de más intenções. Ao som dele, muita menininha decidiu que a hora havia chegado. Hoje, o mundo vive uma inversão de valores, e a missão deste "Everything's OK" é necessária: abençoar a alcova dos justos.
Na primeira faixa (que meu editor recomenda ouvir de joelhos), Al Green decreta o título do disco, porque a partir de agora tudo será OK. "Eu quero voltar para casa, baby/ Aqui fora tudo está errado, baby." Ou seja, prepare a alcova, que o bicho vai pegar.
Malandro, consciente de que para endurecer não é preciso perder a ternura, Green emplaca em seguida uma versão do clássico soul "You Are So Beautiful", célebre com Joe Cocker.
A partir daí, o restante das 12 canções do CD é do próprio reverendo, que deita sua voz -o falsete, que beira o pornográfico, continua o mesmo dos anos 70- sobre um forro que se refere à toda sua trajetória. Das cordas aos ataques de metais, a produção assinada por ele e Willie Mitchell, seu velho parceiro, busca a atmosfera de clássicos como "Call Me" (1973) e "Al Green Is Love" (1975), sem outra ambição que não fosse fazer o povo se amar.
E conseguem. Mesmo reeditando as velhas fórmulas, as canções de Green e Mitchell são provocantes; têm um viço que provavelmente vem da fé que o cantor sempre depositou em seu soul. Mesmo antes de ingressar no seu ministério, o cantor do Arkansas soube combinar a vitalidade do gospel sulista com toda a sexualidade dos ritmos negros seculares.
Em vez de tornar sua música uma pregação inadequada para as pistas, sua devoção o leva a cantar de corpo e alma. Em vez de emitir notas desnecessárias por puro virtuosismo, Green parece conhecer precisamente o ponto G de ouvidos masculinos e femininos.
No meio de todo o erotismo, ainda existe espaço para alguma leve metafísica religiosa, na excelente "Magic Road", mas a tônica mesmo é um disco para se ouvir acompanhado e suando e que nos lembra de agradecer a Deus pela possibilidade do orgasmo. Venha ele ou não.


Everything's OK
    
Artista: Al Green
Lançamento: Blue Note/EMI
Quanto: R$ 35, em média


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