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FILOSOFIA
Obras discutem relações inter-religiosas
PAULO DANIEL FARAH
ESPECIAL PARA A FOLHA
Num momento em que tanto
se anunciam os obstáculos
ditos incontornáveis nas relações
inter-religiosas e em que se acirram as distorções e as radicalizações, compreender o fenômeno
religioso se revela um desafio premente. Nesse cenário, duas obras
apoiadas na filosofia perene vêm
instigar um debate normalmente
pouco afeito às convergências.
Em "A Inteligência da Fé", Mateus Soares de Azevedo explica
que, para a filosofia perene, "as religiões são determinadas por
Idéias, no sentido platônico do
termo, ou arquétipos espirituais
perenes, que se manifestam de
tempos em tempos, cristalizando-se no mundo da história e da mudança. O cristianismo encarna
um desses arquétipos espirituais,
do mesmo modo como o islã, o
judaísmo e as demais religiões.
Cada religião personifica a priori
uma Idéia em particular, mas, a
posteriori, esse protótipo pode se
manifestar secundariamente em
outra religião".
Descreve o luteranismo como
uma manifestação parcial no cristianismo de um arquétipo que se
pronunciara no islã, "uma religião baseada num livro sagrado e
no sacerdócio estendido por assim dizer a todos os homens, sem
falar na iconoclastia no que tange
à arte. Ou seja, esses princípios a
priori típicos da perspectiva islâmica se manifestaram a posteriori
no mundo cristão".
O autor dedica um capítulo ao
filósofo francês René Guénon
(1886-1951) e outro ao filósofo e
poeta suíço-alemão Frithjof
Schuon (1907-1998), um dos porta-vozes da filosofia perene.
Em "Para Compreender o Islã",
Schuon quer mostrar que "a tradição não é uma mitologia pueril
e superada, mas uma ciência terrivelmente real". Critica o cartesianismo ("talvez a maneira mais
inteligente de ser ininteligente"),
o racionalismo ("todo racionalismo direto ou indireto é falso pelo
simples fato de que limita a inteligência à razão, ou a intelecção à
lógica; limita, pois, a causa ao efeito") e a ciência moderna (que
"destrói as bases empíricas das
mitologias sem poder explicar a
significação dos novos dados").
Schuon se inspira no sufismo,
descrito como a medula do islã,
para atenuar as visões conflitantes
e ressaltar a perspectiva da primordialidade e da universalidade.
Cita, entre outros, Jalal ad-Din
Rumi: "Não sou cristão, nem judeu, nem pársi, nem muçulmano.
Não sou do Oriente nem do Ocidente, nem da terra nem do mar...
meu lugar é o que é sem lugar, minha marca o que é sem marca...
Coloquei de lado a dualidade e vi
que os dois mundos não são senão um; busco o um, conheço o
um, vejo o um, invoco o um".
Paulo Daniel Farah é professor na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP
A Inteligência da Fé
Autor: Mateus Soares de Azevedo
Editora: Nova Era
Quanto: R$ 24,90 (196 págs.)
Para Compreender o Islã
Autor: Frithjof Schuon
Editora: Nova Era
Quanto: R$ 29,90 (238 págs.)
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