São Paulo, quarta, 1 de abril de 1998

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MÚSICA
Líder do trio alemão, que se apresenta hoje em São Paulo, diz que o tecno está ligado ao nazismo em seu país
Atari Teenage Riot faz revolução pós-tudo

MARCELO NEGROMONTE
free-lance para a Folha

Pense em Ministry. Em Nine Inch Nails. Somados, soam como Barbra Streisand, se comparados com a avassaladora massa sonora pós-tudo que sai dos amplificadores eletrorrevolucionários do trio alemão Atari Teenage Riot, que se apresenta hoje em São Paulo.
O show de abertura fica a cargo do Caustic, projeto paralelo do não menos insano DJ Loop B, que se apresentou no BoomBahia Festival no mês passado.
Curitiba (amanhã), Londrina (dia 3), Belo Horizonte (dia 4) e Rio (dia 5) são as próximas paradas do hardcore digital do Atari Teenage Riot, trazido pela produtora mineira Motor Music.
Oriundo e dissidente da cena tecno alemã, Alec Empire, 25, anarquista, subversivo, líder do Atari Teenage Riot, falou à Folha por telefone, de Berlim, sobre nazismo, tecno, alienação e Internet.

Folha - Como a Internet -a mais livre das mídias- poderia ser uma forma de controle totalitário?
Alec Empire -
Talvez não seja ainda, mas pode vir a ser. Acho que há um perigo, no nível político, no fato de se disseminar informações tão rápida e facilmente com alcance global. Isso tira as pessoas do mundo real, e em vez de interagir com a vizinhança onde vivem, gastam seu tempo navegando na rede, talvez por insegurança.
Eu acho que nos 90 o paraíso está além da TV e Internet. As pessoas estão perdendo contato com a realidade. Não há ação, e é isso que eu critico na Internet. É a religião dos estúpidos.
Folha - Porque você, que veio da cena tecno alemã, entrou em choque com ela?
Empire -
O tecno se tornou algo muito alienante e voltado à direita na Alemanha. A cena tecno não tem nada a dizer e está muito ligada ao nacionalismo alemão. Um dos DJs mais conhecidos aqui, que promove a Love Parade (Dr. Motte), disse em público que os judeus deveriam calar a boca e parar de se lamentar porque ganharam muito dinheiro depois da guerra. E no dia seguinte, milhares de pessoas vão à festa dele.
Folha - Em que sentido o tecno -que você usa no seu som- e as raves (grandes festas tecno) são alienantes?
Empire -
Acho que as pessoas estão começando a perceber que até dá para frequentar raves e congêneres por uns dois anos, mas isso não leva a lugar algum. Acho que se pode ter mais diversão que dançar e tomar drogas, que é o nível mais baixo de entretenimento.
Folha - Você acha que as raves têm caráter nazista?
Empire -
Quanto mais as raves ficam populares, mais parecidas elas ficam com a juventude hitlerista, que se reunia aos finais de semana para praticar esportes e coisas do gênero. A idéia era direcionar as energias para o nada. O mesmo acontece com as raves -essas verdadeiras prisões do prazer-, em que todos se divertem, mas na segunda-feira estão trabalhando de novo. É uma maneira de dizer sim ao sistema. Acho perigosa uma vida em que você trabalha, acorda, se diverte -entupido de ecstasy, dançando como um zumbi- e volta a dormir.
Folha - E qual é o papel do ATR nessa história?
Empire -
O que queremos quando tocamos ou fazemos discos é que as pessoas se sintam vivas. E isso, às vezes, só acontece quando elas são confrontadas com uma música imprevisível, o que para muitos é um choque, positivo ou negativo. Com o tecno é possível interpretar qualquer tipo de idéia com as letras. Há muito mal-entendido, pois alguns acham que fazemos dogmatismo porque usamos muitos slogans, e isso é confundido com pregação.



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