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São Paulo, quinta-feira, 01 de maio de 2003

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CRÍTICA

Filme enrosca na "armadilha do roteiro"

TIAGO MATA MACHADO
CRÍTICO DA FOLHA

Quando lançou nos EUA o filme que marca sua estréia na direção, George Clooney adiantou-se às críticas ao comentar que "Confissões de uma Mente Perigosa" seria, provavelmente, criticado pelo excesso de direção.
Não há como desmenti-lo: "Confissões" é um amontoado de imagens saturadas, idéias de mise-en-scène mal alinhavadas e cenas fora de tom, combinação que dificilmente deixa de esgotar a paciência do espectador. Sem dúvida, Clooney peca pelo excesso, mas, para um diretor estreante, o pecado não chega a ser dos maiores. Responsabilizar Clooney pelo fracasso de "Confissões" seria cair numa armadilha, a armadilha do roteiro de Charlie Kaufman.
Kaufman ("Quero Ser John Malkovich", "Adaptação") é desses roteiristas que parecem ainda não terem encontrado um diretor à altura de seu talento. Os filmes que partem de seus roteiros dão sempre a impressão de estar aquém do potencial dos originais, mas é bem possível que sejam estes a estar aquém do próprio potencial: Kaufman tem boas sacadas, mas não parece ser dos mais desenvoltos, é brilhante nos efeitos, mas negligente nas causas, o que quer dizer apenas que não teria a menor chance se trabalhasse na indústria cinematográfica americana de meio século atrás. Como trabalha na Hollywood de hoje, ele é considerado gênio.
Era presumível que Clooney, filho de um apresentador de talk show, se deixasse atrair por um roteiro baseado nas memórias de Chuck Barris, "o apresentador mais descarado e desprezível da TV americana". Menos presumível era a aparição de Clooney como um agente da CIA encarregado de treinar Barris para ser um matador profissional.
O que parece mais uma invencionice de Kaufman não passa da última cartada de Barris: em suas memórias, ele sugere que suas atividades de "showman" eram intercaladas com as de "hitman" (matador). Pura ficção, a julgar pelo filme.
Misturando pseudo-documentário com ficção de gêneros diversos (sátira de bastidores, thriller e drama psicologizante), Kaufman talvez ambicionasse transformar o material numa espécie de "Cidadão Barris". Mas nem ele é Herman Mankiewicz nem Clooney é Orson Welles.


Confissões de uma Mente Perigosa
Confessions of a Dangerous Mind
 
Produção: EUA/Canadá/Alemanha, 2002
Direção: George Clooney
Com: Sam Rockwell, Drew Barrimore
Quando: a partir de hoje nos cines Cineclube DirecTV, Jardim Sul e circuito



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