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São Paulo, quinta-feira, 01 de maio de 2003

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CRÍTICA

"Carga" cria merchandising de autor

XICO SÁ
CRÍTICO DA FOLHA

No lugar da velha filosofia de pára-choque, a propaganda desavergonhada. Explícita na fala dos atores. A maior novidade do retorno de "Carga Pesada", série de sucesso do comecinho dos anos 80, é o merchandising de autor. No primeiro capítulo, um caminhão novo, vermelho, de uma marca lá qualquer, foi o centro da trama.
Nem mesmo o possível câncer de Bino (Stênio Garcia), suspense para o próximo episódio, teve mais peso dramático. Que biópsia que nada. Só se falou do "cheirinho de carro novo". O caminhão é celebrado por Pedro (Antonio Fagundes) como brinquedo de criança. Não que homem não seja besta a esse ponto -o falo automotivo, senhores-, mas não carecia protagonizar o maior comercial fora dos intervalos da história da TV brasileira.
A lolita que pega carona para armar uma cilada contra Pedro e Bino fica encantada com a potência -a inveja do pênis, senhoritas- e beleza do novo veículo. O assaltante que espera os três no beco cresce os olhos diante da carreta. É a violência nas rodovias, nova realidade encontrada por Pedro e Bino duas décadas depois, também a serviço do merchandising. Tudo pelo social.
Quando fugiu um pouquinho só do drama bolado pelos marqueteiros, "Carga Pesada" teve um naco da velha e boa prosódia das boléias. Como a fala de Pedro diante de um copo de uísque: "Esse é mais meu tipo de cachoeira que cascata!". Momentos antes, Bino ficara abestalhado diante das cataratas do Iguaçu, que não conhecia. O subtexto da parada, em assobio inzoneiro: moro num país tropical, abençoado por Deus e bonito por natureza... Coisa dos tempos de Amaral Netto, o repórter do "Brasil grande".
Meu pai, ex-caminhoneiro da era do Fenemê, veículo das antigas, implicava sempre com a falta de verossimilhança do seriado que foi ao ar entre 1979 e 81. Chegava a ser chato, muito chato. Isso foi o de menos na reestréia de anteontem. O problema agora é saber até que ponto a trama vai conseguir sair do departamento de marketing para o de criação.
Além da boléia "moderna", outra moda nova é a música-tema. Sai Renato Teixeira, autor e intérprete da versão antiga, e entra Chitãozinho & Xororó. Precisa dizer mais alguma coisa?


Carga Pesada  
Quando: terça-feira, às 22h30, na Globo



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