São Paulo, sábado, 01 de maio de 2010

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Crítica/"Invisível"

Trama engenhosa revela análise banal sobre as "injustiças" do mundo

ALCIR PÉCORA
ESPECIAL PARA A FOLHA

"Invisível" se divide em quatro partes, cada uma destinada a provocar peripécia na anterior. A primeira, passada em 1967, em Nova York, é narrada por Adam Walker, estudante da Universidade de Columbia. Certa noite, é abordado por Rudolf Born, um professor com cara igual à de todo mundo ("invisível"), mas cheio de ideias belicistas e bizarras. Fazem amizade, que só dura até Adam perceber a vileza real de Born.
Na segunda parte, já em 2007, o narrador é Jim Freeman, um escritor consagrado que recebe uma inesperada carta de Walker, seu colega em Columbia, há 40 anos. Era um convite para visitá-lo, acompanhado do relato que já lemos na primeira parte. Dias depois, chegam mais escritos. Referem-se ainda a 1967, depois que Born volta à França, mas revelam, agora, a relação incestuosa entre Walker e a irmã.
No dia da visita combinada, Jim fica sabendo que Walker morrera, não sem lhe deixar novas páginas de memórias - a terceira parte. Contam o que ocorrera em Paris, quando Walker reencontra Born e alerta sua noiva, Hélène, e a filha, Cécile, sobre a crueldade dele.
A última parte mostra Jim indo a Paris, em 2007, para encontrar Cécile, que lhe entrega o diário onde anotara o seu último encontro com Born. Muito gordo, vivia agora cercado de serviçais negros, no topo de uma ilha caribenha, alucinado, e com planos de escrever suas terríveis memórias.
A questão que não quer calar é: o que justifica todas essas idas e vindas no tempo, além das trocas de narradores? Auster parece supor que isso ajuda na revelação da grave questão da "injustiça" do mundo, em particular, da "herança colonial". Aliás, todos os conflitos recentes da história desfilam no livro. Entram por uma linha e saem por outra, como uma lista genérica de desastres e desvarios, sem chegar a compor um simples relato convincente sobre a dor ou a guerra.
Born tampouco se aguenta como versão do Kurtz, de "O Coração das Trevas", que suspeito ter inspirado Auster. Era melhor ter ficado no incesto, e pronto.

ALCIR PÉCORA é professor de teoria literária na Unicamp


INVISÍVEL

Autor: Paul Auster
Tradução: Rubens Figueiredo
Editora: Companhia das Letras
Quanto: R$ 47,50 (280 págs.)
Avaliação: regular




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