São Paulo, sexta-feira, 01 de junho de 2007

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crítica

Filme sobre Capote reflete crise criativa

CRÍTICO DA FOLHA

A crise de originalidade por que passam os roteiristas de Hollywood já andava evidente na proliferação de ficções "baseadas em fatos reais". E torna-se ainda mais gritante quando acontece a dupla produção de uma mesma história, mesmo sem se tratar de uma refilmagem.
Alguns espectadores vão se confundir diante de "Confidencial", com a velha impressão de "já vi essa história antes". Pois esse filme, produzido no ano passado, narra o mesmo recorte biográfico já mostrado em "Capote", realizado um ano antes.
Ambos se detêm sobre a personalidade peculiar do escritor Truman Capote e acompanham seu processo de investigação do assassinato de três integrantes de uma família no interior do Kansas que está na origem da reportagem "A Sangue Frio".
Os longas buscam transmitir ao público uma impressão de veracidade seja por tomarem por base dois trabalhos de biógrafos distintos -feitos com o habitual rigor dos norte-americanos na área-, seja pelo sofisticado trabalho de direção de arte, fiel na representação dos universos distintos pelos quais transitou Capote, do esnobismo nova-iorquino ao provincianismo da cidade interiorana do Kansas.
E ainda funcionam como veículo para atores exibirem excelentes performances na encarnação de um tipo conhecido por sua singularidade física e comportamental. Dado o acúmulo de qualidades, o que resta ao espectador? Ora, é no exercício de comparação que se encontra um dos interesses de "Confidencial". Mas não se trata de contrastar as obras para extrair da disputa conclusões como "a mais fiel".
Trata-se antes de contrastar para se certificar o quanto a expectativa de veracidade se torna limitadora dos significados de uma obra de arte. Em "Confidencial", vemos a lição de casa do verismo seguida à risca, digna de elogios, com um ator incorporando seu personagem no sentido espiritista do termo e o relato preciso do envolvimento emocional do escritor com Perry Smith, um dos assassinos.
Tais rigores de reconstituição, por sua vez, esvaziam o filme de ambigüidades e de riquezas simbólicas. E as transferem para "Capote", onde se enxerga com evidência a indagação ética por trás do percurso do escritor e seus dilemas pessoais provocados pelo choque com a violência e pela vida tacanha dos personagens do interior.
Ou seja, mesmo nos filmes baseados em fatos reais, alguns podem ser mais verdadeiros do que outros. (CSC)

CONFIDENCIAL
Direção:
Douglas McGrath
Produção: EUA, 2006
Com: Toby Jones, Daniel Craig
Quando: estréia hoje nos cines Bombril, Jardim Sul e circuito
Avaliação: regular


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