São Paulo, sábado, 1 de agosto de 1998

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Nunca fiquei tão feliz em acabar um livro, diz Welsh

WENDY CAVENETT
do "Independent"

Com Irvine Welsh, nunca fica claro se tudo que ele diz fazer é em nome de um bom show ou se ele genuinamente acredita em tudo que diz e faz. Quando ele fala de seu sucesso, por exemplo, parece, para quem está de fora, que ele preferia tomar ecstasy.
"É muito embaraçoso. É apenas lixo. Eu fiquei entediado com o sucesso depois de seis semanas." E falando de seu último trabalho, ele diz: "Nunca fiquei tão feliz em acabar um livro".
O incômodo livro é "Filth", um caso da mais básica sordidez e depravação moral. Em "Filth", Welsh constrói uma bizarra comédia noir que tem todas as ásperas atrações de seus trabalhos anteriores. E o que Welsh descreve como sua marca registrada, a prosa "psicoativa", nunca foi tão cheia de energia ou cruel.
"Eu odeio esse canalha", diz Welsh sobre Bruce Robertson, o personagem de seu livro, "mas eu não gosto mesmo de personagens que são muito fáceis, que me deixam feliz. Eu gosto de personagens que contradizem o que eu acredito sobre o mundo."
Nesse contexto, Robertson pode apenas ser escrito como o personagem de Welsh por excelência. Racista, sexista, homófobo e totalmente imoral, Robertson incorpora os aspectos mais terríveis da natureza humana.
Separado de sua mulher, Carole, e pai de uma menina, Robertson é um sargento-detetive na polícia escocesa, louco por uma promoção e próximo de uma semana em uma Amsterdã onde ele irá saciar seus vícios. Robertson tira um prazer malicioso em tudo, salvo seu trabalho enfadonho e uma horrível erupção genital.
"Eu queria escrever sobre instituições", afirma Welsh. "Eu pensei originalmente em escrever sobre uma prefeitura local, mas não havia conflito suficiente. Notei todos esses casos contra a polícia, como racismo e discriminação sexual. Eu queria escrever algo sobre isso, esse tipo de cultura misógina, racista, misantrópica na qual as pessoas se envolvem."
"E pensei", ele continua, "Bem, e se tivéssemos alguém que é um tipo de psicopata genuíno que pode se esconder nesse tipo de cultura?' A ameaça era tentar escrever um personagem que representasse tudo o que realmente detesto, mas então tentar simpatizar com ele."
Robertson descobre que seu desconforto genital é causado por uma solitária, que, em típico estilo Welsh, não apenas tem voz como é a encarnação da consciência de Robertson. "Tinha de existir uma voz de razão chutando contra o psicopata", opina Welsh, "e a solitária se torna essa voz."
Welsh admite que foi depressivo escrever "Filth" e espera que ele "não tenha tanto sucesso quanto "Trainspotting'". "Eu preferiria um público menor, hardcore, do que um enorme."
A idéia de "Filth" nas telas o deixa um pouco desconfortável. "É um livro um pouco difícil para se conviver", ele diz sem medo. "Eu apenas desejava que alguém tivesse de mudar Bruce, você sabe, ajudá-lo a ser uma pessoa melhor. Ele provavelmente não é o monstro que eu imagino que ele seja."


Tradução Denise Bobadilha


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