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"O TRONCO"
Personagens "de verdade" e roteiro são os trunfos
especial para a Folha
"O Tronco", de João Batista de
Andrade, é um filme atípico dentro do moderno cinema brasileiro. Atípico porque bem dirigido,
bem atuado e bem escrito.
Trata-se de um faroeste ambientado em Goiás, em 1919. A
história começa quando o coletor
de impostos Vicente Lemos (Ângelo Antônio) chega a uma pequena cidade do sertão goiano.
Vicente é parente do chefão do
pedaço, o truculento coronel Pedro Melo (Rolando Boldrin), pai
do deputado -e igualmente truculento- Artur Melo (Henrique
Rovira).
Apesar de fazer parte da família
de truculentos, Vicente é um homem justo e honesto. Depois que
o coronel mata um empregado,
Vicente pede ajuda ao governo
para punir os responsáveis.
É aí que a coisa engrossa: as tropas do governo, lideradas por um
juiz ganancioso (Antônio Fagundes), atacam a fazenda e deflagram um conflito entre soldados e
jagunços.
As palavras "filme brasileiro de
época" e "filme de ação" são suficientes para provocar calafrios
nas espinhas dos cinéfilos locais.
Mas "O Tronco" -adaptado do
romance homônimo de Bernardo
Élis- tem o mérito de ser um raríssimo filme de época que não
parece novela da Manchete e um
filme de ação no qual os tiroteios
não são movidos a tiros de espoleta.
O roteiro, escrito pelo próprio
diretor, é simples e eficiente. Há
algumas histórias paralelas, como
a do relacionamento entre Vicente e a prima, Anastácia (Letícia Sabatella), mas nada que atrapalhe a
história principal, o que é sinal de
um roteiro bem feito.
Os diálogos fogem do padrão
tatibitate de novela, que infelizmente estamos nos acostumando
a ver nos filmes nacionais.
Os personagens parecem e falam como gente de verdade -há
alguns excessos, como o personagem Baianinho, um chato de galochas que passa o filme inteiro
cantando, mas isso parece mais
um deslize, provocado talvez por
um antigo hábito de nossos cineastas, que adoram lotar seus filmes com personagens secundários "divertidos".
Outro mérito do filme é o de
mostrar os personagens, mesmo
os figurantes, como gente de carne e osso, e não como meras figuras decorativas.
A pior herança do cinema novo,
e uma que permeia nossos filmes
até hoje, é um paternalismo irritante em relação aos personagens,
especialmente os pobres, que
sempre foram tratados como coitadinhos e expostos como peças
de museu, sem personalidade
própria, sem defeitos ou qualidades, numa visão elitista e pequeno-burguesa que infelizmente é
tida como corajosa.
"O Tronco" não apela para esse
artifício barato. Os personagens
não são maniqueístas nem unidimensionais.
Mesmo o coronel Pedro Melo,
por trás de sua couraça dura,
mostra um quê de humanidade
(palmas para Rolando Boldrin). E
Ângelo Antônio é a grande revelação, um idealista que percebe tarde demais que sua bravura e honestidade tiveram consequências
nefastas.
Talvez a maior qualidade de "O
Tronco" seja mesmo sua simplicidade. O filme não quer mudar o
mundo, apenas contar uma história de forma competente. E consegue.
(ANDRÉ BARCINSKI)
Avaliação:
Filme: O Tronco
Direção: João Batista de Andrade
Produção: Brasil, 1999
Com: Rolando Boldrin, Ângelo Antônio,
Antônio Fagundes e Letícia Sabatella
Quando: a partir de hoje, nos cines SP
Market 5, Belas Artes Mário de Andrade e
circuito
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