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DANÇA/CRÍTICA
Espetáculo do Ballet de Santiago mostra vigor e precisão dos bailarinos ao explorar enredo da cigana fatal
Haydée cria talentosa variação para "Carmem"
INÊS BOGÉA
CRÍTICA DA FOLHA
Toda feita de contrastes, de
sombras e luzes, a "Carmem"
de Marcia Haydée, para o Ballet
de Santiago, alterna quadros trágicos, paródicos e humorísticos
de grande expressão dramática.
Partindo da dança clássica, Haydée coloca em cena uma realidade
dinâmica de forças que definem
homens e mulheres especialmente uns com os outros.
Esta "Carmem" estreou em outubro de 2004, com base na história do escritor francês Prosper
Merimée (1803-70) e na atmosfera dramática da ópera de Bizet
(1838-75), reorquestrada (sem as
vozes) por Albena Dobreva.
A história é muito conhecida:
nas paixões da cigana fatal, em
sua relação com Don José, Haydée nos mostra a liga entre dois
seres cujo desejo de liberdade
obriga à transgressão das regras
sociais. Carmem torna-se "mundana", e Don José, um fora-da-lei.
Os protagonistas de quinta-feira, no Teatro Municipal, Marcela
Goicoechea e Luis Ortigoza, dançaram com precisão e vigor. Cada
um tem seu acento particular. Salientes e angulosos, ou alternadamente simples, transformam o
palco num lugar vivo, conquistando o espaço sem constrangimentos da dificílima técnica. Um
dos grandes momentos é o duo
do final do Ato 1, logo após Don
José matar o soldado, onde cada
gesto tem seu lugar e cada expressão ressalta um sentimento.
A música evoca, não literalmente, a Espanha, mas aquela Espanha imaginária que pertence ao
acervo da composição francesa
(Bizet, Chabrier, Debussy, Ravel).
A trilha reorquestrada cria
grandes intensidades e reforça o
drama. Por exemplo: nos trechos
de José que marcam a sua transformação pessoal, de soldado honesto para insubordinado, levando à deserção e ao assassinato. Assim como marcam também, quase mitopoeticamente, o colorido e
a vitalidade de Carmem.
Se a Micaela dançada por Andreza Randisek podia parecer um
tanto vacilante e algo imatura, essas são características da personagem. Seus passos são suaves e precisos -e é bom ter em mente que
o balé clássico deixa à mostra cada
detalhe. Também o toureiro Escamillo (Rodrigo Guzmán) demonstrou um virtuosismo sempre confirmado pelo acabamento
preciso dos passos.
O corpo de baile está sempre
coeso; e vale ressaltar a difícil cena
dos soldados, com um trecho da
"Sinfonia em Dó Maior", também
de Bizet, incorporada à música
original. E a cena da taberna, em
que paródia dos garçons bêbados
e a conquista da mulher do toureiro ganham na pantomima.
O cenário de Pablo Nuñez
-um semicírculo de madeira
elevado- é simples, mas eficiente, como os acessórios cênicos.
São complementados por projeções, numa tela à frente ou ao fundo do palco, por grades que descem e por recursos como um pano para formar as montanhas,
completar o espaço da tourada ou
ampliar a tensão da cena da morte, ao final do espetáculo. Os figurinos, também de Nuñez, são ricos de detalhes e cores. E a luz de
Alberto Garcia cria zonas próprias, favorecendo a construção
das cenas.
"Mais uma Carmem?", poderá
perguntar alguém. Já não se tinha
Merimée e Bizet, e o filme de Carlos Saura, e o balé de Mats Ek e...?
Mais uma, sim, e não é qualquer
uma. Em torno à impossível Carmem ideal, gravitam infinitas variações do mito, entre as quais,
agora, também a Carmem de
Marcia Haydée, exercendo com
talento suas paixões.
Carmem
Quando: hoje, às 21h, amanhã, às 17h
Onde: Teatro Municipal (pça. Ramos de
Azevedo, s/nš, tel. 0/xx/11/222-8698)
Quanto: de R$ 40 a R$ 130 (ingressos: pelo tel. 0/xx/11/6163-5087)
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