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COMIDA
Era do gelo
Chefs e restaurantes
renomados se rendem aos
picolés com ingredientes
exóticos, como pistaches
colhidos ao pé do vulcão
Etna e frutas nacionais como mama-cadela e bacuri
JULIANA BIANCHI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Num mundo dominado por
bolas, casquinhas e copinhos,
surgem os palitos. Renegados
por muitos a atalho para aplacar o calor nos dias mais quentes, os picolés ganham espaço
entre gourmets e curiosos.
A marca Rochinha, que angaria fãs no litoral paulistano desde a década de 80, ganhou força
nos últimos anos com a expansão da distribuição na capital
-300 pontos de venda- e com
a chegada de concorrentes como a Frutos do Cerrado e a Diletto, todas em busca de uma
clientela de paladar apurado.
Lançada no fim de 2008, a
Diletto é uma das marcas mais
festejadas entre os entendidos.
Tanto que conquistou espaço
em menus de restaurantes como o Due Cuochi Cucina, o Paris 6 e o Buffet Fasano. Seguindo a base de fabricação dos "gelatos" italianos, ela conseguiu
trazer para o palito um nível de
cremosidade difícil de se encontrar no Brasil, inclusive nas
misturas que não levam leite.
"Ficamos dois anos na Itália
aprendendo como se faz o verdadeiro sorvete italiano. Depois, adaptamos o maquinário
e a receita", afirma Fábio Meneghini, sócio da marca.
Mas o segredo não está só na
textura dos picolés. O diferencial também vem do sabor, resultado de cuidadosa seleção de
ingredientes, 90% dos quais
vindos do exterior. Assim, a
marca conta com framboesas
orgânicas da Patagônia, pistaches colhidos ao pé do vulcão
Etna, na Sicília, coco da Malásia
e chocolates da Venezuela,
Costa do Marfim, Java e República Dominicana. Os 12 sabores são vendidos em locais como a Casa Santa Luzia e o Zena
Caffè, e custam de R$ 4 a R$ 6.
Frutas nativas
Já a Frutos do Cerrado apresenta os sabores do Brasil ao
brasileiro. Vedete dos que estão
dispostos a se embrenhar no
exotismo do Centro-Oeste, a
marca criada em Goiás, em
1996, por Clóvis José de Almeida, investe em frutas praticamente desconhecidas no Sudeste, como o araticum, a mutamba, a bacaba, a mama-cadela, a brejaúba e o guapeva.
Comercializados a R$ 3, os 36
sabores da marca poderiam até
custar mais caro devido à complexidade para a obtenção dos
sucos. Colhidas de árvores nativas que aos poucos começam a
ser plantadas nas fazendas da
família, as frutas da região não
costumam ser das mais ricas
em polpa, o que demanda mais
trabalho.
Para se ter uma ideia, um bacuri tem em média 2 g de polpa
utilizável. Para produzir 3.000
sorvetes, é preciso 80 kg. "Na
hora da colheita, ainda temos
de levar em conta as aves, que
também se alimentam dos frutos. Por isso, deixamos intactos
cerca de 10% dos pés", diz Jean
Haddad, sócio da empresa.
A marca só trabalha com produtos sazonais, respeitando a
safra de cada ingrediente, como
a bocaiuva e o baru, que devem
chegar às lojas no verão.
A intermitência de sabores
também é uma realidade à qual
a clientela fiel da marca baiana
Capelinha já se acostumou. "O
povo já sabe que siriguela só
tem de novembro a janeiro, e
tamarindo, de agosto a novembro", afirma o fundador Antônio Mota dos Santos. Mesmo
com o grande fluxo de paulistas
que sai de sua única loja, em
Salvador, carregando embalagens de isopor com picolés para
viagem, ele não se anima em
ampliar a produção.
"Só trabalho com perfeição e
não dá pra fazer isso em grande
quantidade", diz ele, que, aos 73
anos, garante que ainda vai
quase todos dia à feira de São
Joaquim (na Cidade Baixa) para escolher pessoalmente as
melhores frutas do dia. "É como um shopping pra mim."
Em escala um pouco mais industrial, a Rochinha já garante
a maioria de seus sabores o ano
inteiro. Nem por isso limitou-se aos clássicos chocolate e morango ou ao indefectível picolé
de coco que fez a fama da marca. "Sempre trabalhamos com
novidades, como o coco com
abóbora, que já é sucesso em
massa e no verão virá também
em palito", diz a nutricionista
Débora Guimarães.
Sofisticação
Mais leves e com menos aditivos e gorduras do que as versões em massa, os picolés demandam um pouco mais de estudo para que não se tornem
meros blocos de gelo com sabor. Mesmo na líder de mercado, a Kibon, o trabalho de desenvolvimento de um sabor pode levar cerca de seis meses, como aconteceu com o Fruttare
Caseiro, que vem com pedaços
grandes de fruta, e a linha Magnum Devotion, que traz lascas
de chocolate na massa.
Com maior valor agregado, a
novidade reflete a oportunidade de mercado para os picolés
mais sofisticados. A Kibon
aposta nesse segmento desde o
fim do ano passado, quando
anunciou o reposicionamento
da linha Magnum, que ganhou
dois novos sabores: cookies e
avelã com castanhas.
A próxima a entrar nessa seara deve ser a Vipiteno, comandada por Laurent Suaudeau.
Segundo Gleusa Guimarães
Ferreira, sócia da casa, no fim
do ano eles partem para uma
feira do setor na Itália onde estudarão levar para o palito as
criações geladas do chef.
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