São Paulo, quinta-feira, 01 de outubro de 2009

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"Estou completamente fora de moda"

Em tempos de download, Maria Bethânia lança CDs de modo tradicional e comenta carreira de cantoras que projetou

Cantora afirma que nunca usou leis de incentivo para seus shows e que tem todos os vestidos que usou em cena guardados na Bahia

MARCUS PRETO
ENVIADO ESPECIAL AO RIO

Agora que, além de filiada a uma gravadora, também é dona de um selo, o Quitanda, Maria Bethânia, 63, pegou gosto: só grava discos aos pares. Esta semana, lança mais dois, de canções inéditas: "Encanteria", com repertório que, como "Brasileirinho" (2003), remete ao interior do Brasil, e "Tua", focado em canções românticas. A cantora deu a entrevista a seguir no estúdio carioca em que ensaia para os shows.

 

FOLHA - Os seus discos trazem músicas novas de Adriana Calcanhotto e Vanessa da Mata, duas de suas pupilas. Como analisa a carreira delas?
BETHÂNIA
- Estão pipocadíssimas. Adriana sai sempre da rotina, escreve livros. Isso é importante, distancia a gente desse bicho, dessa faca de dois gumes que é o sucesso. Vanessa mantém o jeitinho dela, ainda me manda música pra eu cantar em casa. Mas está no momento do furacão. Daqui a um ano, vamos ver onde é que ela vai se assustar.

FOLHA - Mais uma vez, você lança dois CDs simultâneos -e em um tempo em que os discos não vendem. Por que e para quem?
MARIA BETHÂNIA
- Hoje, eu acho que tudo isso é obsoleto: gravar disco, dar entrevista. É tudo muito antigo. Estou completamente fora de moda. Não a minha música. Eu. O meu sentir, o meu querer, eu fazer essas coisas. Aprendi assim e não quero desaprender. Vivo para o meu ofício, ele nunca me incomodou, não me machucou, nem foi traiçoeiro ou mentiroso. Sempre quis de mim exatamente isso que faço com ele. Um casamento que deu certo.

FOLHA - Casamentos mudam muito com o correr dos anos...
BETHÂNIA
- Sim. Você vai envelhecendo. Os anos vão passando. A sua voz já está numa outra emissão, o chão do palco que você pisa é diferente. Tudo vai andando. Envelhecer é sempre novidade.

FOLHA - Não é repetição?
BETHÂNIA
- Acho uma burrice achar que é repetição e que as coisas vão perdendo não sei o quê. [Envelhecer] é um privilégio. Já imaginou quantas estrelas vão ser descobertas e eu estou viva pra ver? Estar andando no tempo é bênção.

FOLHA - Caetano está numa fase em que o novo e o velho são confrontados. Você gosta?
BETHÂNIA
- Adoro. Caetano está apaixonado de novo pelo palco e pela música, dizendo as verdades dele. Ele é bonito assim, nu. Tem erro, tem acerto, tem bonito, tem feio, tem bom, tem ruim. Mas Caetano é assim. Gosto de vê-lo completo.

FOLHA - Você mudou sua banda, ela está menor. Por quê?
BETHÂNIA
- Queria mais espaço para a voz, mais silêncios. E tinha pouco dinheiro.

FOLHA - Você não tem dinheiro?
BETHÂNIA
- Eu não tenho nada! Só o que preciso: onde morar, o que comer, como ter boa medicina. E posso trabalhar. Com honra. Acho que isso sim é dignidade. Não é só barriga cheia.

FOLHA - Você nunca usou benefícios de leis de incentivo?
BETHÂNIA
- Nunca me meti com isso. Trabalhei minha vida toda sem patrocínio nenhum. E, de repente, não se pode mais trabalhar sem patrocínio. E para ter patrocínio, a Lei Rouanet tem que liberar. É uma confusão. Então, não me meto. Digo: "Tenho tanto do meu dinheirinho pra fazer meu show e não pode passar disso porque não tenho de onde tirar".

FOLHA - Faria uma autobiografia?
BETHÂNIA
- De jeito nenhum! Não gosto de nada disso. Trabalho muito em cena e tenho todos os figurinos desses 45 anos e não posso, por uma questão religiosa, me desfazer deles. Estão embalados em uma casa na Bahia para eu não ver. Fico apavorada.


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