São Paulo, sexta-feira, 01 de outubro de 2010

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice | Comunicar Erros

ENTREVISTA MALCOLM GLADWELL

É bom para o jornalista ser mais observador do que participante

NASCIDO NA INGLATERRA E "INTRUSO" NOS EUA, ONDE SE TORNOU BEST-SELLER, AUTOR LANÇA LIVRO COM COLETÂNEA DE REPORTAGENS INUSITADAS

Brooke Williams/Divulgação
O jornalista Malcolm Gladwell, que vendeu 8 milhões de livros nos EUA

FERNANDA EZABELLA
DE LOS ANGELES

Malcolm Gladwell tem uma teoria e quer que você pense a respeito.
Na verdade, são algumas teses e muitas histórias curiosas, coletadas em 14 anos de trabalho como repórter da revista "New Yorker".
"O que se Passa na Cabeça dos Cachorros", lançado neste mês no Brasil, reúne 21 dessas reportagens de fôlego. Algumas partem de um assunto banal e enveredam por caminhos quase científicos, como uma sobre por que não há tantas variedades de ketchup como de mostarda.
Outras fazem o inverso: falam de assuntos intrincados e chegam a conclusões compreensíveis para leigos. Exemplos disso são os textos sobre soluções inusitadas para os sem-teto nas grandes cidades ou sobre como a falência da Enron poderia ter sido evitada.
"Meus artigos são planejados como uma convocação, quero detonar uma discussão. Quero que as pessoas pensem sobre o que normalmente não pensam."
As reportagens são sempre tão comentadas que hoje o jornalista é abordado nas ruas de Nova York, onde mora. "Às vezes me dão ideias muito boas [para textos]", diz Gladwell, que viaja o mundo dando palestras (esteve em São Paulo duas vezes).
O nome do novo livro vem de um artigo sobre Cesar Millan, apresentador de "O Encantador de Cães" (exibido no Brasil no Animal Planet).
Malcolm, 47, tem outros três títulos, todos best-sellers nos EUA, onde já venderam mais de 8 milhões de cópias: "Fora de Série - Outliers", "O Ponto da Virada" (editados no Brasil pela Sextante, R$ 29,90, 48 págs. e 288 págs., respectivamente) e "Blink - A Decisão num Piscar de Olhos" (Rocco, esgotado).
Cada um destrincha algumas de suas ideias. Em "Outliers", ele afirma que o sucesso de um indivíduo "fora de série" é resultado de muitas variantes incontroláveis e não tanto do talento. Já em "Blink", fala do poder da intuição e sobre como analisamos pessoas sem pensar.

 

Folha - Como foi revisitar suas reportagens antigas para o novo livro?
Malcom Gladwell
- Sempre que você olha para as coisas que escreveu, algumas o constrangem, outras o fazem muito feliz. Separei minhas favoritas, que passaram pela prova do tempo. Às vezes, seu pensamento muda ou você se sente mais inteligente sobre aquele assunto. É o mesmo caso com qualquer obra de arte. Às vezes, o tempo é generoso; às vezes, não.

Você se considera um "outlier" [fora de série]?
[Silêncio] Não, não acho. Sou alguém que escreve sobre eles. Quando uso o termo no livro, realmente me refiro a esses tipos de gênios, não a pessoas comuns como eu.

Qual a teoria, então, para explicar quatro best-sellers?
Acho que isso se chama sorte. E tive oportunidades enormes. Comecei numa época em que jornais ainda eram poderosos e gastavam com treinamento de jovens repórteres. Depois, fui para a "New Yorker". Só por estar lá escrevendo você ganha público e credibilidade. Meus editores são brilhantes, melhoram muito minhas matérias. Portanto, estive em situações muito mais fáceis de conseguir sucesso do que a maioria dos jornalistas. Acho importante reconhecer a sorte.

Você é meio jamaicano, nasceu na Inglaterra, foi criado no Canadá e mora em Nova York. Qual é a sua nacionalidade?
É engraçado, sou bem brasileiro, todo misturado, não? Mas eu me identifico como canadense, eu cresci lá. Mas é preciso entender que ser canadense é meio como ser brasileiro -você pode ser muitas coisas ao mesmo tempo.

Como essa mistura ajudou na sua carreira?
Acho que é vantajoso ser um "outsider" [intruso] nos EUA, você vê coisas de uma perspectiva mais fresca. Acho que é sempre bom para o jornalista ser um pouquinho de fora, mais observador do que participante.

Daria alguma dica para quem está começando agora no jornalismo?
Nos dias de hoje, é importante ter uma área de especialidade. Porque o jornalismo, para sobreviver, tem que ser inteligente, oferecer algo que não se acha em qualquer lugar. Se estivesse começando agora, adoraria ter uma especialidade.

O que fez a diferença para a "New Yorker", que conseguiu aumentar sua circulação em mais de 20% nos últimos dez anos?
Num momento em que o mundo ficou bem mais complexo, as pessoas perceberam que precisavam de fontes inteligentes de comentário em suas vidas. E é isso o que somos. Somos o lugar aonde as pessoas vão para entender o mundo.

O QUE SE PASSA NA CABEÇA DOS CACHORROS

AUTOR Malcolm Gladwell
EDITORA Sextante
TRADUÇÃO Ivo Korytowski
QUANTO R$ 39,90 (400 págs.)


Texto Anterior: Opinião: Curtis marcou não apenas pela beleza de galã, mas pela ambiguidade do olhar
Próximo Texto: Autor se define como "tradutor do mundo acadêmico'
Índice | Comunicar Erros



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.