São Paulo, Segunda-feira, 01 de Novembro de 1999
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TELEVISÃO
Ofélia nunca deveria ter morrido

TELMO MARTINO
Colunista da Folha


A Ofélia nunca deveria ter morrido. Tão simples em sua intimidade com o fogão e com a ajuda só da Aparecida para ficar de olho no relógio. Mas a Ofélia morreu e nunca soube o que aconteceu com as panelas da televisão. Sorte a dela. Duvida-se que tivesse paciência com a cozinha dessa Ana Maria Braga que a TV Globo trouxe de um dos canais bregas de São Paulo.
Tanta gente escreveu sobre essa transferência, com palavras até adequadas para um tratado de sociologia, que a Vera Loyola talvez tenha vivido um susto. Tolinha. Ela fica no ar o tempo que quiser, sempre com aquela cara de que nunca houve uma mulher igual a Vera. Já a Ana Maria Braga é coisa de pouco mais de uma hora nas tardes dos dias úteis da TV Globo.
Uma hora e poucos minutos muito difíceis de preencher. Enquanto a companhia é a de um chef e de panelas que enlouquecem de inveja as mulheres com tempo disponível para ter fogão como paisagem para uma tarde preguiçosa, tudo está bem. O inacessível não tem defeitos.
Mas o resto do programa é uma ansiosa cópia do que uma revista feminina tem de indispensável para uma banalidade. O sopro de comédia está no papagaio chamado Louro José. Como fantoche ele é bem apresentado, mas tudo o que diz revela sua admiração pelo Clodovil.
No primeiro programa, a encantadora Glorinha Kalil apareceu morta de vergonha dos amigos. Tolice da adorável Glorinha. Falando sempre de moda, ela disse que o verão exigia que o ouro fosse escovado. Esperteza da encantadora Glorinha. Pedindo uma trégua para o ofuscante, ela desapareceu na leveza do ar. Os que fazem do "Mais Você" um "Estou fora" nunca mais encontraram a Glorinha aconselhando um "gloss" para disfarçar. A Ana Maria, aliás, não tem muita convivência com palavrinhas estrangeiras tão indispensáveis para uma ou outra leveza. O chef falou num "flavourzinho", e ela foi entendo, com muito prazer, por cheirinho.
Desde o primeiro programa, permanece ocupado o "Coin Cony", cheio da "poésie timide" de um escritor escondido. Ana Maria suspira com essas palavras de qualidade, adorando a oportunidade tão rara de se mostrar uma mulher sensível. Como o desafinado, quer mostrar que no seu peito brega também bate um coração.
O programa está cheio de cabeleireiros, maquiadores e mulheres bonitas. De vez em quando aparecem os rapazes dos bastidores. Isso vai durar pouco. São mais elegantes em seu bege. Aparecem mulheres com problemas muito pessoais. Para isso existe um jovem psicanalista de plantão. Em suas palavras existe sempre uma solução.
Tem a hora para falar de silicone, e o momento de o elenco da TV Globo ser sábio e sensível. A Cassia Kiss foi bem depressinha. A Tônia Carrero se viu num teatro e confessou que nunca deixou de ser estrela. É verdade que agora só como matriarca na hora do almoço, com lugar para os bisnetos. O tempo passa. Talvez o mesmo aconteça com a Ana Maria Braga comendo de cócoras a comida que a Marluce já deve ter dito que é dela e do almoço de quem foi convidado.


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