São Paulo, quinta-feira, 01 de novembro de 2007

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Lina Chamie rima amor e dor na tela

Em "A Via Láctea", segundo longa da cineasta, que estréia amanhã, homem em situação-limite tenta superar crise romântica

Filme usa trânsito de SP como metáfora da solidão e do imprevisto; "nem sempre o que vem à janela do carro é o que se quer ver", diz diretora

SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL

Na voz da atriz Alice Braga, a frase "Heitor, eu estou aqui!" é a primeira e a última que se ouve em "A Via Láctea", longa-metragem que estréia amanhã, em salas do Rio e de São Paulo.
Entre uma frase e outra, a diretora Lina Chamie alinhava diversos fragmentos de um discurso amoroso no qual o lingüista francês Roland Barthes é apenas uma das referências.
Heitor, interpretado por Marco Ricca, é um professor de literatura em crise no romance com a veterinária Júlia (Braga).
Atordoado pela briga que teve com a namorada ao telefone, pelos ciúmes que sente dela, pela falta de interesses comuns que a diferença de idade entre os dois impõe, Heitor se atira no trânsito de São Paulo, na tentativa de reencontrar Júlia.

Citações
No percurso, vêm à tona a memória do romance e as expectativas que ele acordou em Heitor, povoadas por citações de Barthes -"Na doce calma de seus braços"- e por imagens da amada, que ele julga ver espalhadas em outdoors na cidade.
Chamie filmou no trânsito de São Paulo, sujeita aos seus engarrafamentos reais e constantes. No "corpo-a-corpo com a cidade", ela diz que tentou subverter o pressuposto do "controle que a situação de dirigir [cinema] envolve", além de estender à direção o aspecto do personagem de "estar desesperadamente em busca".
Ao optar por cenas com registro documental, a cineasta lançou mão do fato de que "nem sempre o que vem à janela do carro é o que se quer ver", para acentuar a situação de perda de controle em que se acha o protagonista.
Para Ricca, essa escolha significou o desafio de "dar credibilidade dramática ao personagem, sem bater o carro".

"Cabeça a Prêmio"
Preparando-se para dirigir seu primeiro longa no ano que vem -uma adaptação do livro "Cabeça a Prêmio", de Marçal Aquino, que terá Alice Braga e Otávio Muller no elenco-, o ator diz que hoje só aceita projetos de outros cineastas que o queiram como "sócio intelectual" na empreitada.
"Lina fez com que eu adentrasse esse universo poético que ela domina", diz Ricca, para quem o filme "é poesia pura e pede do público certa generosidade, como a que se tem para ler poesia -não pode ser com pressa".
Embora se insira no cinema autoral e opte por "uma narrativa não-linear", na montagem de André Finotti, Chamie diz que se preocupou que o filme não fosse "um exercício estético, porque não é aonde queria chegar com uma história sobre o reconhecimento do amor e o desejo de não partir".
Ricca avalia que o tema de "A Via Láctea" atraia um público amplo e diz que comprovou isso no envolvimento da platéia nas sete sessões que ele teve na Semana da Crítica, em Cannes.
"Afinal, "A Via Láctea" trata desse sentimento bruto que é o amor, de como ele pode ser subversivo, do grau de violência que envolve, do que ele pode provocar a favor de alguém ou contra si mesmo", diz o ator.


Texto Anterior: Cinema: "Festa da Menina" recebe incentivo
Próximo Texto: Crítica: Diretora aprofunda sua linguagem poética
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.