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FOLHA - O senhor viu o roteiro antes das filmagens?
BANDEIRA - Não. O conselho que me deram foi: "Venda o livro e não peça para participar do roteiro porque senão você vai ter um infarto". Então eu assinei e disse: "Façam o que quiser". Parece que a minha parte eles respeitaram, mas introduziram muitas novidades. Eles esticaram a história, em que as princesas falam mal dos príncipes. E ela [Xuxa] introduziu os príncipes, que são os maridos da Xuxa, o Luciano Szafir, e da Angélica, o [Luciano] Huck. A Xuxa faz a Cinderela, e a Angélica faz a Rapunzel. Tem uma atriz muito simpática que faz a Branca de Neve, mas o nome eu não sei. A que faz a Bela eu também adorei. A Chapeuzinho é uma atriz muito baixinha, do "Zorra Total". [No filme] Os príncipes jogam futebol, e o técnico do time é um dos anões da Branca de Neve, o Dunga. É um anão mesmo. Os príncipes são filhos da mesma família e têm uma mãe, que é a Hebe Camargo. Tem umas piadas lá,mas não é nada meu.Tudo invenção deles.

FOLHA - Já viu algumas cenas?
BANDEIRA - Vi o trecho com as bruxas e achei ótimo, com atrizes ótimas. A maquiagem é espetacular. A cena está linda. A [personagem] Belezinha é uma menina, uma boa "atrizinha", porque a Sasha, que faz a Feiurinha, é uma menina que não tem talento nenhum... A Tizuka [Yamasaki] falou: "Não, cinema é a arte do engano, a gente engana". Ela disse que a menina deu o maior trabalho.Mas me parece que está bonito.

FOLHA - Quando surgiu o convite, logo topou, ficou empolgado?
BANDEIRA - Não, meu amor, na minha idade não tem mais empolgação. Já tive tantas tentativas de filmarem histórias minhas, a "Droga da Obediência" principalmente. Nunca foi pra frente porque o custo é alto. Só que a Xuxa, com sua ligação com a TV Globo, tem mais recursos, tem mais dinheiro. Então fez uma produção mais rica. E vai ser bom porque vai sair na mídia e tal.

FOLHA - E que impacto vai ter a adaptação do livro para o cinema?
BANDEIRA - Vai vender bastante livro. Mas falei para o assessor da Xuxa: "Meu filho, Feiurinha já vendeu 2,5milhões de exemplares, tem uma média de cinco leitores por exemplar. Você nunca terá isso de espectadores". O máximo que ela [Xuxa] já teve foi 4,8 milhões de espectadores, com "Lua de Cristal". O último filme dela ["Xuxa em Sonho de Menina"] teve só 300 mil espectadores. Só300 mil.

FOLHA - O Pedro Bandeira de 20 anos atrás e o que escrevehoje...
BANDEIRA - É outro.A gente fica mais maduro. Mudei bastante. Hoje, eu gostaria de fazer só história infantil, para criança menor. O livro juvenil, estou cansado dele. A editora gostaria que eu fizesse,mas, não sei, só me vêm ideias para criança menor.Não sei se é porque sou avô, tenho cinco netos [com idades entre dois e 11 anos]. Não sei, a parte de aventura eu não estou gostando de fazer. E era omeu forte.Não estou com vontade de fazer aventura.

FOLHA - Porquê?
BANDEIRA - Não sei, estou com vontade de fazer humor. Gosto de brincar mais, fazer palhaçada. Depois também é difícil você fazer sucesso onde já tem sucesso. Como é que vou fazer um livro que agrade mais do que a "A Droga da Obediência", que já tem mais de 1,5 milhão de exemplares vendidos? Como vou competir comigo mesmo?

FOLHA - Vários autores já brincaram com a inversão nos contos de fadas.
BANDEIRA - Eu adoraria fazer "A Bela e a Fera" numa versão mais juvenil.Hoje em dia, a história é toda bobinha. Mas "A Bela e a Fera" é de um erotismo total. [Os contos de fadas] são histórias eróticas, brutais, violentas. Em "Chapeuzinho Vermelho", ele estupra a menina. Ela [Chapeuzinho] se deita nua na cama como lobo. O lobo serve a carne da avó pra ela comer. Ele bebe o sangue da avó. Imagine se a gente vai contar essas histórias para as crianças? Na história da Rapunzel, por que a bruxa descobre que o príncipe está subindo lá? Porque a barriga da Rapunzel começa a crescer, ela está grávida. Só que, hoje em dia, você não põe essas coisas. Com o politicamente correto, ficou um saco escrever! Muito chato! Eu NÃO sou politicamente correto. Nos meus livros, cego chama cego, e não deficiente vi-su-al; anão é anão, e não verticalmente prejudicado. Isso tudo é uma bobagem, uma hipocrisia.

FOLHA - O senhor e a Xuxa se encontraram? Como foi a conversa?
BANDEIRA - Sim, o livro já tinha sido acertado. Ela foi muito carinhosa, conheci a filhinha dela, uma menina tímida, muito tímida, tema idade das minhas netas. Mas ela é muito profissional e gentil. Não é por nada que há 30 anos é uma estrela.

FOLHA - O senhor a admirava como figura para a infância?
BANDEIRA - Não sei, eu não sou de televisão. A minha praia é outra, eu nem assisto televisão, nunca assisti a uma novela na minha vida.

FOLHA - Nunca viu Xuxa na TV?
BANDEIRA - Os programas dela sempre foram vespertinos, não? Imagine se eu ligoa televisão de dia em casa, só se tiver passando algum jogo de futebol! A minha televisão é ligada em filme de DVD, para assistir a filme velho, principalmente da década de 40. Sou muito cinéfilo, tenho mais de mil filmes em casa. Filme me ajudou muito a escrever. A linguagem sintética do cinema, a linguagem rápida, a linguagem de montagem, pá, pá. Se pegar "A Droga da Obediência", é cinema puro. Tanto que adotaram o livro na escola da Sasha, ela gostou e levou para a mãe. A Xuxa gostou, achou puro cinema e quis fazer. Mas ela puxou o livro para a Cinderela, porque ela é loira. Meu livro é centrado na Branca de Neve. Ela diminuiu o papel da Branca de Neve.

FOLHA -Porque a Branca de Neve é seu personagem principal?
BANDEIRA - Branca de Neve foi a primeira heroína da minha vida. A bruxa da Branca de Neve é a primeira vilã daminha vida.É a história que eu ouvi no colo da minha mãe. Tremi de medo da bruxa. Então era fácil que, na hora de liderar o castelo das princesas, fosse no da Branca de Neve. Também é mais engraçado dizerDonaBrancaEncantado, porque antes o sobrenome dela era de Neve. Chapeuzinho Vermelho ficou solteira.É tudo brincadeira, mas tudo muito respeitoso com os contos de fadas.Meu único medo com relação ao filme é que eles tenham "chanchado" as histórias, tirado o respeito que eu tenho por essas heroínas, que são eternas. Eu fico de joelhos na frente dessas heroínas.

A jornalista viajou a convite da organização da 13ª Jornada Nacional de Literatura.


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