|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
Nem tão fantástico
Programa da Globo registra a pior audiência de sua história; especialistas culpam novas mídias e esgotamento do formato do "Fantástico" (1973)
Divulgação
|
|
Bailarinas na primeira abertura do "Fantástico" (1973)
AUDREY FURLANETO
DA SUCURSAL DO RIO
RODRIGO RUSSO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Há 36 anos como principal
atração de domingo da Globo, o
"Fantástico" registrou as piores médias de audiência de sua
história neste ano. No último
domingo, chegou a 17,6 pontos
de média na Grande São Paulo,
abaixo de outro momento crítico, quando fez 17,8 na estreia do
reality show "Casa dos Artistas", do SBT, em 2001. Também é de 2009, no início de outubro, sua terceira pior marca,
de 18,1 pontos de média.
A queda no Ibope do programa da Globo acontece em momento em que os concorrentes
pulverizaram a audiência entre
20h e meia-noite de domingo.
A Record tem média de 13,1
pontos, o que lhe dá o segundo
lugar com o "Programa do Gugu", que estreou em 30 de agosto. Já o SBT, que ocupa parte do
horário com o "Programa Silvio
Santos", tem 9,8 pontos. A Rede
TV!, com o "Pânico na TV!" das
21h às 23h30, faz 8,6 pontos
(veja quadro nesta página).
A baixa no Ibope significa
que o formato de programas
como o "Fantástico" esteja em
crise? Ou que a concorrência ficou realmente fortalecida?
Eugênio Bucci, professor de
jornalismo da ECA-USP (Escola de Comunicação e Artes), levanta a hipótese de que o formato do programa, uma revista
semanal eletrônica, generalista, possa estar esgotado.
"Há 30 anos, a TV tinha menos opções, menos canais e menos competição. Ali, essa fórmula de revista não era banal,
mas sim interessante", diz Bucci. Com a segmentação, ele
acredita que os programas têm
de ter nível de especialização.
Para ele, pode ser difícil para o
público identificar "a cara do
"Fantástico" hoje", enquanto
sabe com mais facilidade o que
esperar dos concorrentes.
Essa avaliação é similar à de
Muniz Sodré, especialista em
comunicação e professor da
UFRJ (Universidade Federal
do Rio). Para Sodré, a queda de
audiência do "Fantástico" se
deve à "saturação da forma". "O
"Fantástico" fez bem seu papel
durante muitos anos, mas tem
um momento em que todo formato se satura, como se tivesse
dado tudo o que tinha que dar."
Mudança de público
Segundo Sodré, com a internet e a "possibilidade de cada
um participar da elaboração da
informação", altera-se pouco a
pouco a relação segundo a qual
um centro irradia notícias e informações e outro só recebe.
"A participação na construção da notícia, pelo comentário
nos blogs, por exemplo, obriga
uma mídia centralizada, como
a TV, a redefinir seus públicos",
afirma. "O público amplo de
massa dos anos 1970 se constitui em comunidades a partir
dos anos 1980. A grande mídia
não parece ter notado isso."
Sodré continua: "Não acho
que essa pulverização [de audiência] seja eterna, mas agora,
em função da internet, estamos
vivendo isso".
Marcio Oliveira, vice-presidente da agência de publicidade Lew, Lara, ameniza a situação do programa em relação ao
mercado publicitário: "A pior
audiência do "Fantástico" ainda
é muito grande", diz. Para ele, o
mercado ainda não vê como
problema a queda da última semana, mas Oliveira entende como crucial o comportamento
da audiência durante a exibição
das novas temporadas dos realities "A Fazenda", da Record, e
do "BBB", da própria Globo.
"No domingo à noite, as pessoas estão querendo relaxar,
não esquentar a cabeça, o que
foge do conteúdo sério apresentado pelo programa", opina.
Para ele, o "Pânico na TV" ganha força com esse movimento.
Ser "uma pedra no sapato" da
Globo é motivo de orgulho para
Alan Rapp, diretor do "Pânico",
humorístico que nas últimas
seis semanas alcançou por alguns minutos (24 no máximo)
o primeiro lugar na audiência.
"Há um ano, a gente achava
quase impossível ficar em primeiro lugar no horário do "Fantástico'", diz Rapp.
Homero Salles, diretor do
"Programa do Gugu", da Record, vê na distribuição do público a explicação para a perda
de liderança do concorrente.
"Não acho que devemos considerar apenas a queda do "Fantástico". Eu assisto, e acho que
está normal. Não tem problema
com o programa. Podem estar
procurando chifre em cabeça
de cavalo", diz.
"Entrou um "player" novo,
que é o Silvio Santos. Veio um
reforço para a Record [Gugu] e
o "Pânico" está atravessando fase muito boa. Seria simplista
dizer que o "Fantástico" caiu.
Sem querer puxar para o lado
do meu programa, creio que os
números baixos do "Fantástico"
se devem à ascensão da concorrência. Não é queda de qualidade nem crise de identidade."
O desempenho no Ibope levou o dominical da Globo a formar mutirão de emergência:
convocou repórteres e profissionais de jornalismo para produzir conteúdo com assuntos
policiais.
Em novos quadros do programa, como "Liga das Mulheres", "Cinco Meninas e um Vestido" e "Reunião de Condomínio", há a tendência de apostar
na proximidade com a vida do
telespectador. Nos últimos oito
domingos, cinco quadros entraram na atração.
A proposta inicial dos criadores do "Fantástico" -José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o
Boni, e Walter Clark, responsáveis pelo "padrão Globo de qualidade"- era mesclar jornalismo e entretenimento. "Fazíamos musicais bonitos, ousados.
O programa tinha bastante liberdade cultural", lembra o cineasta Domingos Oliveira, que
dirigiu quadros de sucesso do
"Fantástico" nos anos 1970.
Colaborou THIAGO NEY , da Reportagem Local
Texto Anterior: Mônica Bergamo Próximo Texto: Comentário: Atração era cosmopolita entre concorrentes provincianos Índice
|