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DANÇA
Cia. 2 Nova Dança coloca à prova a identidade brasileira
INÊS BOGÉA
CRÍTICA DA FOLHA
Onde começa o começo? A
cena está aberta desde sempre, e tanto os bailarinos quanto o
público caminham em busca de
um lugar.
"Artérias - Quando se Perde o
Norte", criação da Cia. 2 Nova
Dança, sob a direção de Adriana
Grechi, cruza sentidos dentro e
fora do palco, à procura também
de um novo sentido brasileiro para a dança. Limites usuais são
transcendidos e a identidade é
posta à prova: sempre com bom
humor, graças a Deus, até nos
momentos menos inspirados.
A "cultura popular brasileira"
(entre aspas, ou lutando contra
elas) foi o ponto de partida declarado para a pesquisa de movimento. O palco está cheio de objetos, que vão do universo indígena,
passando pelo afro-brasileiro e
caindo nas metrópoles, com seus
cestos de plástico.
O que é símbolo e o que é concreto, o que é tangível e o que é só
tangenciado se confundem nesta
nova natureza, onde um pau não
é um pau e uma pedra não é uma
pedra. Mas também podem ser.
Algumas vezes, é bom que se diga, esse tipo de ironia soa fácil.
Por exemplo (já que falamos em
pedra): o nu do começo. Um bailarino deitado, coberto com uma
saia de tule, com um brinquedo
sonoro na mão. Ao se levantar,
deixa tudo à mostra. Sai de cena,
então, para voltar de cueca e "começar" a dançar. A repetição obsessiva de movimentos, que os vai
esvaziando de sentido, acaba também esvaziando o esvaziar. A ironia última seria ver nisso mesmo
o propósito da dança, mas é norte
demais para se perder.
Por outro lado, é mais importante ainda que se diga, há muitos
momentos impressionantes, pela
força de criação do movimento.
Como o solo de Sheila Arêas: seu
corpo avança se arrastando pelo
chão, em gestos fragmentados,
que usam o peso e as articulações
como dobradiças -tanto do jeito
natural como reverso. Criam-se
assim formas insólitas, num corpo "impossível", que se fixa no espaço apenas o bastante para passar a outro movimento, tão dobrado e estranho quanto o primeiro.
Esse tipo de gesto nasce de um
processo de improvisação que é
característico do grupo. São reações intuitivas ou decisões conscientes, que provocam outras reações, que modificam a primeira
intenção... até que se cria uma linguagem. Eis uma coisa: faça alguma coisa com ela, deixe-a fazer
por si, deixe-a fazer com você; eis
uma outra coisa: faça alguma coisa com ela. Quem busca o norte
perde o norte; quem perde busca.
Tudo muito instigante. O que não
desculpa o mau acabamento, aqui
e ali.
Certo "Brasil brasileiro", com os
sinais comuns de erotização e banalização do corpo feminino, ao
som de marchinhas de Carnaval,
leva, com toda a justiça, na cabeça. A música anima o gingado caricato. Um Bela Vista Social Club,
ou desconstrução do Bexiga, com
marimbas.
Tanta descontinuidade nem
sempre dá a volta em si mesma e
talvez nem precise. Perdida entre
mil artérias metafóricas, com o
sangue confuso nas veias, a Cia. 2
Nova Dança permanece sendo
uma das fontes saudáveis de inspiração e irritação para todos nós.
Cada um depois que perca e ache
o sul.
Artérias - Quando se Perde o
Norte
Quando: hoje, às 21h, e amanhã, às 20h
Onde: Sesc Consolação (r. Dr. Vila Nova,
245, SP, tel. 0/xx/11/3234-3000)
Quanto: de R$ 7,50 a R$ 15
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