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Crítica/erudito
OSB recebe Kurt Masur em noite pouco inspirada
ARTHUR NESTROVSKI
ARTICULISTA DA FOLHA
A essa altura da temporada, ninguém mais sai de
casa, enfrentando a
marginal Pinheiros, a garoa e o
frio de 11C, para escutar pela
enésima vez a abertura "Mestres Cantores" de Wagner
(1813-83), a "Sinfonia Inacabada" de Schubert (1797-1828) e a
"Novo Mundo" de Dvorak
(1841-1904), a não ser por um
motivo muito especial. O motivo era especial mesmo, na
quarta, no Alfa: a presença do
maestro Kurt Masur, diretor da
Orquestra Nacional da França
e da Filarmônica de Londres,
em visita ao Brasil para reger a
Orquestra Sinfônica Brasileira.
Masur, que regeu por décadas a Gewandhaus de Leipzig e
depois a Filarmônica de Nova
York (da qual é diretor emérito), já esteve em São Paulo duas
vezes, em 2001 e 2003, sem falar em sua atuação à frente da
Orquestra do Festival de Campos do Jordão, no ano retrasado. Na época em que veio reger
a Osesp, Roberto Minczuk era o
regente assistente; e Minczuk,
que foi trompista da Gewandhaus, é descrito por Masur como "um filho". Com a ida de
Minczuk para a OSB e Campos
do Jordão, o "pai" (prestes a
completar 80 anos) vai com ele.
Hoje à noite rege a OSB em
concerto gratuito na praia de
Copacabana.
Sua postura no palco nunca
foi bonita. Não é um maestro de
gestos expressivos nem se esforça para fazer qualquer coisa
que não seja organicamente ligada a uma intenção musical. E
suas intenções são sempre orgânica e expressivamente focadas na partitura, compreendida
como um todo: nada acontece
por efeito local.
O que não quer dizer que cada detalhe não seja motivo de
cuidado. Masur é um grande
mestre do contraponto: uma de
suas maiores virtudes é a capacidade de fazer ouvir duas ou
três coisas ao mesmo tempo,
todas com clareza e freqüentemente de modo nunca percebido antes, mesmo nas peças
mais conhecidas.
Outra marca característica
é a articulação das frases, que
ele esculpe no espaço com clareza de arquiteto, mas em fo-
go de pedra.
A abertura "Mestres Cantores" sempre será um prato
cheio para esses virtuosismos;
e a OSB se saiu muito bem, tocando com gosto e confiança,
fazendo ouvir um sentido internalizado da música. Se isso
não se repetiu no resto do programa, exceto em alguns momentos, fez ouvir, de qualquer
modo, uma sugestão concreta
do que pode se tornar essa
orquestra.
A OSB melhorou muito sob
a direção de Minczuk, mas parece ter estacionado cedo. Ha-
ja empenho e haja coragem para o salto.
A nota especial da noite, li-
teralmente, ficou com os solos
do corne-inglês (Victor Astorga), no segundo movimento
do Dvorak. Musicalíssimo, afinadíssimo, mudando por dentro o tempo da música, sem
alterar o pulso.
Se não foi uma noite inspirada, serviu para registrar a assinatura de Masur nesse trabalho de reconstrução da OSB,
agora descrita, com justo or-
gulho, como a orquestra "da
cidade do Rio de Janeiro". Se é
bom para o Rio, é bom para o
Brasil, o que inclui a cidade de
São Paulo.
AVALIAÇÃO: bom
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