São Paulo, sábado, 02 de junho de 2007

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Crítica/erudito

OSB recebe Kurt Masur em noite pouco inspirada

ARTHUR NESTROVSKI
ARTICULISTA DA FOLHA

A essa altura da temporada, ninguém mais sai de casa, enfrentando a marginal Pinheiros, a garoa e o frio de 11C, para escutar pela enésima vez a abertura "Mestres Cantores" de Wagner (1813-83), a "Sinfonia Inacabada" de Schubert (1797-1828) e a "Novo Mundo" de Dvorak (1841-1904), a não ser por um motivo muito especial. O motivo era especial mesmo, na quarta, no Alfa: a presença do maestro Kurt Masur, diretor da Orquestra Nacional da França e da Filarmônica de Londres, em visita ao Brasil para reger a Orquestra Sinfônica Brasileira.
Masur, que regeu por décadas a Gewandhaus de Leipzig e depois a Filarmônica de Nova York (da qual é diretor emérito), já esteve em São Paulo duas vezes, em 2001 e 2003, sem falar em sua atuação à frente da Orquestra do Festival de Campos do Jordão, no ano retrasado. Na época em que veio reger a Osesp, Roberto Minczuk era o regente assistente; e Minczuk, que foi trompista da Gewandhaus, é descrito por Masur como "um filho". Com a ida de Minczuk para a OSB e Campos do Jordão, o "pai" (prestes a completar 80 anos) vai com ele. Hoje à noite rege a OSB em concerto gratuito na praia de Copacabana.
Sua postura no palco nunca foi bonita. Não é um maestro de gestos expressivos nem se esforça para fazer qualquer coisa que não seja organicamente ligada a uma intenção musical. E suas intenções são sempre orgânica e expressivamente focadas na partitura, compreendida como um todo: nada acontece por efeito local.
O que não quer dizer que cada detalhe não seja motivo de cuidado. Masur é um grande mestre do contraponto: uma de suas maiores virtudes é a capacidade de fazer ouvir duas ou três coisas ao mesmo tempo, todas com clareza e freqüentemente de modo nunca percebido antes, mesmo nas peças mais conhecidas.
Outra marca característica é a articulação das frases, que ele esculpe no espaço com clareza de arquiteto, mas em fo- go de pedra.
A abertura "Mestres Cantores" sempre será um prato cheio para esses virtuosismos; e a OSB se saiu muito bem, tocando com gosto e confiança, fazendo ouvir um sentido internalizado da música. Se isso não se repetiu no resto do programa, exceto em alguns momentos, fez ouvir, de qualquer modo, uma sugestão concreta do que pode se tornar essa orquestra.
A OSB melhorou muito sob a direção de Minczuk, mas parece ter estacionado cedo. Ha- ja empenho e haja coragem para o salto.
A nota especial da noite, li- teralmente, ficou com os solos do corne-inglês (Victor Astorga), no segundo movimento do Dvorak. Musicalíssimo, afinadíssimo, mudando por dentro o tempo da música, sem alterar o pulso.
Se não foi uma noite inspirada, serviu para registrar a assinatura de Masur nesse trabalho de reconstrução da OSB, agora descrita, com justo or- gulho, como a orquestra "da cidade do Rio de Janeiro". Se é bom para o Rio, é bom para o Brasil, o que inclui a cidade de São Paulo.


AVALIAÇÃO: bom

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